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domingo, abril 09, 2006 

Desprezível

Ainda a propósito dos detractores de Syriana, algumas considerações a propósito do senhor Amir Taheri que eu linkei no post abaixo, autor do artigueco THE DESPICABLE SELF-LOATHING PREACHED BY 'SYRIANA'.
(Uso aqui de propósito o link para o Morocco Times, para ilustração do que é possível publicar na imprensa árabe, ao contrário do que poderia fazer supor o "despicable self-loathing" do senhor Taheri).

1- A direita passa a vida a lamentar-se com a "cassette" da esquerda tocando a propósito de tudo e de nada, e eis aqui um exemplo típico de uma análise política metida a martelo a propósito de um vulgar filme.

Fora o argumento uma inanidade ao estilo do Chuck Norris a ir dar cabo do Vietnam em meia hora de metralha e quebra-pescoços, um pagode do James Bond salvando o mundo nos braços de uma belissima agente Ciosa dos delírios patológicos de um general renegado norte-coreano ou a heróica aventura de um Rambo semi zombificado a combater de olhos arregalados ao lado dos simpáticos muhajeddin afegãos até aniquilar totalmente os russos nesse país e arredores,
e à canzoada de serviço ao aparelho de propaganda do sistema Bush não mereceriam reparos as agruras do Clooney no perigoso tabuleiro do xadrês politico militar do Médio Oriente.
Então o filme do Rambo no Afeganistão à luz dos novos preconceitos da "war on terror", é uma delícia. Nem falta o "príncipe afegão diplomado em Oxford...".
Mas como o argumento do Syriana envolve as "chefias" políticas e económicas americanas numa conspiração infelizmente credível, salta a tropa do (neo)politicamente correcto a bramar inanidades vendo o filme exclusivamente como uma espécie de documentário hiper realista.

2- Como sempre acontece nestes casos, a direita que defende os privilégios dos mais ricos, que exalta "o sucesso", e que acha que "é bom ser rico", quando precisa de atacar alguém não recua perante qualquer arma de retórica, incluindo os velhos recursos populistas contra "os que pretendem fazer dinheiro" etc...

Fazer dinheiro, o sucesso, ser rico etc., é o máximo desde que se continuem a usar as palas para só ver para a frente.
Se o retrato deixa de ser a preto e branco torna-se um crime lamentável.

3- No meio de tanta trapalhada Taheri diz algumas verdades. Muitos dos atentados que têem vitimado politicos e dirigentes no Médio Oriente ocorrem devido à luta feroz pelo poder no interior das classes dirigentes árabes e das várias facções militares e religiosas ao nível local e regional. Mas é também sintomático que no seu enunciado se esqueça que foi um atentado perpretado por um extremista religioso judeu agindo de forma aparentemente independente que pôs fim ao que nas últimas décadas pareceu ser o momento mais próximo do início de um verdadeiro apaziguamento na região.

4- Taheri já cá anda há algum tempo... já ocupava cargos de responsabilidade nos jornais no seu Irão natal na época do Xá, conhecido benfeitor e defensor dos direitos humanos...
O mesmo Xá que alcançou o poder com um golpe com alguns traços que fazem lembrar aquele que é descrito em Syriana, um golpe documentado e reconhecido (1) mas que o Richard Perle o informou ser um mito...
A questão é assim virada ao contrário... Taheri indigna-se porque as "teorias da conspiração" que procuram justificar tudo o que se passa no Médio Oriente como manipulação dos americanos relegando os árabes para um papel passivo e infantilizado.

Mas para Tahari, a presença da nação mais poderosa do planeta com um orçamento militar que ultrapassa a soma dos orçamentos militares dos restantes países naquela região nada tem a ver com política ou guerra, os americanos apenas estão lá a ver a bola.
Será que ele está a tentar menorizá-los? Ai, ai...

5- Evidentemente que os Taheris que por aí pululam quando escrevinham estas "análises" fazem-no graciosamente, quando muito recebendo o dinheiro do passe como recompensa do serviço público.

É meramente uma empresa de relações públicas que conta entre os seus membros com reputados especialistas independentes especialistas notáveis como os senhores Richard Perle (que ao contrário dos princípios da firma é especialista não em diálogo mas em "choque de civilizações"), Charles Krauthammer e James Woolsey .
Uma das forças do aparelho de propaganda neoconservador são estas associações "rigorosamente independentes". Haja dinheiro para todo este povão...
Ter de aturar aqui e ali uns para-quedistas a tentar cravar uns cobres é um incómodo menor quando a causa é grande.

(1) Sim, é mais um link da New York Review of Books, é uma fonte mais credível do que este palhaço.
(2) Encontrei uma linkagem para este artigo também no Metablog