quarta-feira, fevereiro 27, 2008 

Para dizer, o quê?

No site do Público, Teresa de Sousa pergunta "o que leva Lisboa a manter um silêncio sepulcral sobre o reconhecimento do Kosovo? " (adoro estas coisas do "silêncio sepulcral"...)
Pergunta o anónimo: para dizer, o quê?

 

O impossivel que acontece frequentemente

Apesar de vários sábios nos garantirem amíude e a pés juntos que é impossível, aconteceu, o impossível. Avariaram-se 5 reactores 5 da central nuclear de Turkey Point na Florida e quatro milhões de pessoas ficaram sem electricidade.
É claro que azares, mesmo os impossíveis na altura de vender o produto, acontecem a qualquer um não é? E como sempre deve haver uma justificação séria.
Em primeiro lugar a central ( bem como todas as outras que frequentemente têm avarias graves, muitas delas nunca reportadas publicamente) ainda não explodiu, isso é impossivel e só foi possível no laxismo da decadente ditadura soviética.
Em segundo, há demasiada interferência d'o Governo na vida privada das pessoas, certamente, demasiada regulação, talvez... É, deve ser isso...

 

Há males que vêm por bem

Azar dos azares, não é que o sistema de back up dos e-mails da Casa Branca (não é no Alentejo, é ali em Washington) era tão primitivo que se perderam no éter 473 dias de mensagens (no mínimo) do período entre Janeiro de 2003 e Agosto de 2005?
Lá se foram na enxurrada as mensagens do gabinete do azarado vice-presidente Cheney que está compreensivelmente inconsolável porque correspondem à época em que foi lançada a investigação judical do caso Plame, relativo à revelação feita por membros da Administração Bush ao segundo mais alto nível da identidade de uma agente da CIA cujo marido pusera publicamente em causa a tese do combustível nuclear para o Sadam comprado na Nigéria.
Theresa Payton, a porta-voz do escritório da Casa Branca garantiu que estão muito empenhados em esclarecer a questão e qualquer pessoa de bem compreende e acha isto muito natural. São coisas que acontecem a qualquer um em qualquer altura.

terça-feira, fevereiro 26, 2008 

Oportunamente correcto

Populismo, foi a palavra que oportunamente entrou recentemente no vocabulário mediático de um dos países com maior índice de desigualdade da Europa.
Alguém, eventualmente o Presidente da República, refere os ganhos dos gestores de topo de empresas públicas, privadas e instituições bancárias? - Populismo.
Alguém (que não certamente o Presidente da República) chama a atenção para os ordenados baixos da esmagadora maioria dos trabalhadores portugueses?- Populismo, (e populismo perigoso, atente-se).
Felizmente que temos opinion makers muito livres e sobretudo principescamente pagos para reflectirem as sensatas opiniões dos gestores de topo das empresas públicas, privadas e instituições bancárias para nos alertarem atempadamente para os ordenados e direitos exagerados da esmagadora maioria dos trabalhadores portugueses e contra as tentações do politicamente correcto que no meio da normalização geral ainda teima em estrebuchar.
Mesmo este post, eu bem sei, é populismo puro...

 

Kosovwar

Ainda não entendi bem a orientação política desta revista mas o artigo da Jacqueline Carpenter sobre o Kosovo é excelente. Curto e incisivo é o melhor que li até agora sobre o assunto, e uma alternativa saudável aos artigos "sensatos" que nos apresentam a "solução" da independência como a mais lógica.
Uma tragédia no fim de um túnel de misérias.
Uns aplaudem, outros apupam, mas são os kosovars quem tem de se aguentar à bronca de um novo "país" dominado pela corrupção, e o crime violento com particular incidência para o tráfico de mulheres.
Também a este respeito, um texto bem interessante do Vasco Pulido Valente no Público do passado dia 22 cujo link encontrei na extensão do Lavoura blog.

 

Pág. 5

Angels & Devils, pág.5
S.Clay Wilson, 1972, Zap Comix n.º 6

domingo, fevereiro 24, 2008 

Funes

Parece que nos Estados Unidos (where else?) existem pessoas com hiper-memória autobiográfica que lembram Funes, um personagem do conto de Jorge Luis Borges, Funes el memorioso, incluído nas Ficciones.
Onde, como, conseguem armazenar a informação necessária para recordar os factos de qualquer dia do seu passado? Uma pergunta para os técnicos de hardware, para os técnicos de software, para os teóricos da informação, os biólogos evolucionistas, os teólogos, os políticos, eu sei lá...
Um dos indívíduos, um locutor de rádio, parece divertir-se com a situação, mas para o outro, uma mulher, o "dom" é um pesadelo semelhante ao de Funes. Será por ter lido Borges?

sábado, fevereiro 23, 2008 

O túnel

Pertenço àquela meia dúzia de bárbaros subdesenvolvidos que com total desprezo pelas estatísticas persiste em recear viajar de submarino.
O futuro pertence, sem dúvida, a esse povo de alguns milhões de global commuters. Altos, de cabeça rapada, fato cinzento, sapatos do tipo campor e gravatas e camisas em tons improváveis, arrastando continuamente, tal como Sísifo, pesados trolleys cinzentos e falando continuamente para auriculares blue tooth.
A sensação é a de estar num filme de aventuras. O herói chega ao fundo de uma caverna mal iluminada pela sua tocha, perseguido de perto por um povo qualquer dos subterrâneos que a evolução das espécies tornou cego e improvavelmente carnívoro, para se deparar com um sinistro poço de águas negras como o petróleo.
Um beco sem saída.
No silêncio possível permitido pelo crepitar da tocha e os guinchos próximos da horda de monstros que se aproxima, o herói consegue distinguir ao longe um marulhar que os seus ouvidos experimentados identificam como o estrondo das ondas a embater numa falésia.
Não há tempo para pensar.
Sem tirar as botas mergulha rapidamente com a tocha e após alguns longos segundos de pesada angústia para os espectadores, ei-lo que emerge triunfante à superfície das águas tranquilas e acolhedoras de um qualquer oceano, a distância segura da costa da ilha assombrada.
A lógica do filme dita que os excepcionais dotes do herói lhe permitam sempre chegar ao outro lado.
É este o meu dilema para viajar para longe. É esta a minha incapacidade para me tornar num global commuter.
Para além de não ser alto, não gostar de rapar a cabeça ou de usar sapatos campor, e nem pensar em andar por aí engravatado arrastando trolleys enquanto falo para auriculares .
Para mim, quando as portas do aparelho se fecham, é como se chegasse ao poço das águas negras e não soubesse o desfecho do filme apesar do sorriso tranquilizador das hospedeiras.

 

Já não dá

Diz o povo e com alguma razão:

Já não se fazem homens assim.

terça-feira, fevereiro 19, 2008 

Boa onda

Numa jogada arrojada, a Atlantic, uma das mais influentes revistas americanas, decidiu disponibilizar on line todos os seus conteúdos, incluindo arquivos.
Parece arriscado mas sabe bem ver alguém a contra corrente da tendência normal de restrição de acessos seguida pela maioria dos meios de comunicação.
Quem se quiser dar ao trabalho de reler esta revista imprescindível tem ali elementos de estudo representativos da evolução de uma certa corrente política norte-americana que nos últimos sete anos passou do apoio quase incondicional a Bush e à aventura iraquiana, às dúvidas e à tomada de consciência do desastre e finalmente a uma avaliação global muito negativa da actual administração.
Um exemplo é o aparecimento nas suas páginas de Andrew Sullivan, um modelo para alguns dos bloggers conservadores portugueses que passou do apoio incondicional à invasão do Iraque à sua rejeição e ao apoio a Barack Obama.
Também há os imperialistas indefectíveis, como o fou du village Robert Kaplan. Mas também este passou de uma retórica triunfalista de cronista da expansão imperial para um cepticismo desencantado de sage incompreendido dissecando as causas da decadência do Império.
Para alguns americanos que cavalgaram a onda da regressão ultra conservadora iniciada com Reagan e cujo apogeu foi o Bush filho, o estudo dos clássicos converteu-se numa alucinação que os levou a reviver em sete anos a história gloriosa da ascenção e queda de um novo Império Romano. Um facto tão enebriante que se propagou como fogo na pradaria à cabeça de bárbaros de todas as regiões do globo .
Basta ver a série de artigos sobre a América que Bernard Henry Lévy publicou nas páginas da revista e que redundaram em livro, basta ver os nossos neo-conservadores de pacotilha repetindo as mesmas frases batidas sobre o "politicamente correcto" e a "liberdade" quando até o fundamento último do fascínio exercido pela América, o poder económico, ameaça ruína, em grande parte graças ao sucesso que a Administração Bush teve na aplicação das receitas extremistas que nos são apresentadas amíude nos editoriais e crónicas de bastos opinion makers do burgo como o caminho para a Salvação.
De tão sensibilizado que estou com esta opção da Atlantic, que provavelmente vou renovar a minha assinatura em papel.

domingo, fevereiro 17, 2008 

Em bruto

A adolescente impertinente que habita nesta casa adora política, não sei porque carga de água.
O seu político preferido é o Santana Lopes (dasss...).
"A Esquerda é uma mentira", berra pela casa para me chatear.
A prazo, terei de enviá-la para o Gulag se quiser descanso na velhice...
No outro dia foi com a sua turma do Liceu a uma sessão da Assembleia da República.
Eis a avaliação que fez:
Sócrates - Um fiasco total. Não responde a nada. Responde às perguntas com perguntas. Na televisão, a reportagem da sessão deu uma ideia de segurança totalmente contrária ao que se passou na Assembleia. (não tenho parti pris, estou só a citar a miúda)
Santana Lopes - Uma decepção. Esteve melhor do que o Sócrates mas também respondeu a muitas perguntas com perguntas.
Portas - Espectacular, o melhor em campo. (isto só prova como sou imparcial no meu relato do relato dela).
Louçã - Seguro e em bom plano mas com uma voz irritante. (idem)
Jerónimo de Sousa - Monocórdico. Até começou bem mas depois foi torpedeado por uma deputada dos verdes que o fez meter os pés pelas mãos e permitir ao primeiro ministro fugir ao debate num assunto que tinha a ver com crianças mortas e maternidades fechadas.
Grupo parlamentar do PS - Muitas mulheres com penteados ridículos.
Grupo parlamentar do PP - Com bom aspecto. Mas quando se esperava uma compostura própria de conservadores tiveram um comportamento de javardos em algazarra permanente. Uma labregagem decepcionante. (palavras rigorosamente da miúda, sic)
A esquerda (PC e Bloco) - Inesperadamente bem comportada.
O pormenor cómico - O Presidente da Assembleia falando com a boca colada ao microfone e repetindo na sua voz inconfundívelmente suporífera (foi a miúda que disse) - Pode concluir Sr. Deputado.

 

Não durmas descansado

Um ídolo com pés de barro foi apanhado nas malhas (apertadas) do controle anti-doping.
A bem da "verdade" do Desporto.
O atleta em questão foi, ao que parece como é lógico, suspenso.
O que lhe vale é ser amador, caso contrário estaria arruinado.
Assim, é só uma maçada.
Dadas as características sociais do jogo imaginar-se-ia que a substância ilícita em causa se tratará de whiskhy de boa qualidade, tabaco de cigarro ou puro de luxo.
Não se entende porque raio há-de um jogador de bridge drogar-se com outra matéria, dirá o incauto.
Não é tão simples como isso, meu amigo.
Trata-se de um jovem de sessenta anos e foi um remédio para a hipertensão que trouxe o descrédito.
Imagine as vantagens ilegítimas que terá se defrontar num torneio um adversário igualmente sexagenário, igualmente hipertenso mas que não tome o remédio.
Hum? Já imaginou?
Mais uma matéria de difícil resolução para o Secretário de Estado do Desporto.
Está em causa o bom nome do Desporto Português.

 

Cantinhos românticos de Lisboa

Para levá-la quando vier a chuva.


























 

Blogofrenia

Nos sons da escrita uma passagem do Livro do Riso e do Esquecimento de Milan Kundera, interessante para uma reflexão sobre os blogs.
A blogosfera foi, no seu início, um espaço de encontro e intervenção.
Com a sua generalização, permitida pelo preenchimento das condições apontadas por Kundera a propósito dos livros, o blog tornou-se num espaço quase autista em que a possibilidade de partilha e encontro se vai cristalizando acabando por se restringir a pequenas tribos mais ou menos fechadas. Cada uma delas acha-se "a blogosfera" e dessa circunstância deduz as suas reflexões sobre o "fenómeno".
A blogomania generalizada agrava o isolamento.
Um pouco como na "realidade", passamos diariamente por pessoas silenciosas cujo interesse ( de uma ou outra entre tantas) só viremos a conhecer, se viermos, por um processo quase aleatório.
Umas intrigam-nos e observamo-las durante um instante mais, o tempo de se fechar a porta de uma carruagem de metro. Na estação seguinte, haverá mais destas figuras fantasmagóricas que farão esquecer as anteriores, na maioria dos casos para sempre.
Num ou noutro caso acontecerá que voltaremos a encontrar alguma delas.
Mais raro ainda, reconhecê-la-emos.
O mundo é pequeno diremos nessa altura.

 

Matrizes

Na noite passada acordei dentro de um sonho em que estava dentro de um avião.
Apercebi-me de que estava num avião ao dar comigo comprimido contra as costas de uma cadeira azul a observar um ecrã de televisão do fundo de uma sala estreita em plano suspeitamente inclinado cheia de filas de cadeiras iguais à minha.
Nalgumas dessas cadeiras estavam sentados ordeiramente indivíduos silenciosos que eu não conhecia de lado nenhum.
Percebi que estava a sonhar porque sabia que era Sábado e só dentro de alguns dias terei de viajar de avião.
Ainda por cima sabia que tinha acabado de me deitar depois de uma insónia que tentei liquidar vendo um programa de televisão cujo tema eram os desastres de avião. Uma hospedeira havaiana era sugada para o exterior, para cima e ligeiramente para o lado esquerdo de uma testemunha (às onze horas disse a testemunha).
Como é normal nestes casos, quando uma pessoa percebe que está a sonhar, e a não ser que tenha treinado técnicas para manter esse estado de consciência do sonho dentro do sonho, acorda.
Como detesto estar dentro de aviões, decidi acordar imediatamente, sair dali, voltar para a realidade que eu sabia bem mais agradável, apesar das graves ameaças à liberdade que pesam sobre as nossas frágeis democracias.
O problema é que não acordava. Por mais que eu fizesse, por mais que eu pensasse que estrebuchava na cama tentando bater em algo que me fizesse acordar continuava fechado dentro do avião.
Imóvel na cama.
Percebi que perceber que estava a sonhar e não conseguir acordar era um ingrediente perverso adicional que fazia parte do pesadelo, o que, ao invés de me aliviar, me trouxe um desespero ainda maior.
Percebi que uma pessoa não acorda quando quer.
Receei ficar encerrado naquele mundo claustrofóbico para sempre apesar de aparentemente deitado na minha caminha para quem me observasse de fora. O que aconteceria se o avião caísse?