domingo, junho 29, 2008 

Frankenstein

Mugabe já não é deste mundo.
Vive já, no delírio da atroz revisitação de uma brincadeira que a criança caprichosa quer jogar assegurando-se de que vai ganhar a qualquer preço, entregue aos fantasmas da senilidade.
Neste momento a responsabilidade é menos dele do que de todos os que se prestam a esta mascarada aberrante que não dispensa encenações com "juízes" de perucas idênticas aos da odiada potência colonial, como se fosse essa a caução que realmente conta.
O caso Mugabe, mais um a somar à lista de líderes africanos a enlouquecerem com o poder, é a tragédia que culmina cinco décadas de nacionalismo africano.
Não que se trate de alguma "especificidade" africana, como algumas primas donas assustadas com os germens hipoteticamente reaccionários das críticas aos ditadores africanos, se apressam a desmentir. Para "não dar armas ao Bush", os imbecis.
O que há de "específico" e trágico nos regimes terceiro mundistas é a perpetuação dos líderes, em total contradição com os princípios que os alcandoraram ao poder.
O que há de terrível, para além dos massacres, é a indulgência cumplice e criminosa de alguns regimes africanos "amigos", com particulares responsabilidades para a África do Sul e Angola.
Sobretudo a África do Sul que é a referência e barómetro.
Não denunciar este facto e branquear crimes cometidos com lascívia à vista de todos é, ao contrário do que julgam os "tácticos" da treta, mais uma facada nas costas de todos os africanos que querem a Paz, a Liberdade e acreditam na Democracia.
Isso sim, é "dar armas" aos Bush(es).

 

Habitats naturais (2)


 

Rust never sleeps


Vem aí o Neil Young.

Não sei porquê, mas neste clima de fim de festa só me apetece ouvir o Tim Hardin.

 

Habitats naturais (1)


 

Os novos paradoxos

A globalização fez explodir as categorias.
De repente o "progresso" torna-se no "mal" que todos temem.
A afluência, conseguida à custa de conquistas políticas e da pilhagem do terceiro mundo surge agora como o resultado "último" da "irracionalidade capitalista".
Tudo estava bem desde que os chineses e indianos continuassem a viver miseravelmente.
De repente descobre-se que os recursos do planeta são finitos e que não dá para alimentar tanta gente...
Se adivinhasse o que se iria passar quarenta anos depois, que mensagem iria a esquerda dos anos cinquenta salazaristas enviar ao povo português?
Deixem os franceses e os alemães que caminham para a tragédia...este é o paradigma da felicidade possível desde que se elimine o Ditador?
Mas não seria o Ditador a forma mais eficiente de manter o atraso "amigo da natureza"?
Estamos prestes a reabilitar a fúria anti urbana dos khmer rouge?

 

Talvez Pessoa

Uma mensagem perdida no trânsito que é simultaneamente um belo epitáfio, a explicação de um súbito abandono e um programa político credível.

 

Inexplicável

Tentáculos segurando a presa? Algas brincando com a corrente? Ramos procurando a luz? Talos? Dedos sôfregos saciando e prolongando a sede? Veículos?
Serpentes?
Hidras?
Arquitecturas magnificamente visionárias ?
Que fazer?

Sempre o mesmo mistério que nos empurra para cima, até algures e arrasta para baixo até às fronteiras erosionadas do cliché.
É belo? É inexplicável.
nota: imagem de partes do corpo de Laura Dern em filme de David Lynch.
Fotografia do ecrã de uma televisão de baixa definição .

 

Vem o Verão

A estação do rock, rumo ao Sul. O tempo quente em que perdemos Jimmy Hendrix.

 

Obsolescência

Ontem à noite, depois da apresentação do livro de Slavoj Zizek na Cinemateca, mais uma discussão sobre a actual crise energética e o fim anunciado da civilização tal como nós a conhecemos...
Fim da civilização, ou melhor, um retrocesso para uma espécie de Idade Média.
Para os conservadores poderá ser o regresso a um estado "natural" pré-Revolução Francesa, sem teorias utópicas a prejudicar o equilíbrio das coisas "no seu devido lugar"; para alguns esquerdistas e ambientalistas poderá significar o regresso a um passado idealizado de maior "comunhão" do "homem com a natureza" ainda longe da alienação capitalista.
O fim da história será assim, não a democracia burguesa ou liberal, não o comunismo depois da passagem pelo socialismo, mas uma espécie de alternativa entre o feudalismo e o comunalismo consoante a predisposição genética faça uns mais pessimistas e outros mais optimistas, já que não há como enquadrar a discussão num nível mínimo de racionalidade...
Se a conclusão é a de que a humanidade está prestes a crescer até aos 8 biliões de indivíduos pelo crime de ter abusado dos combustíveis sólidos, e uma relação mais "natural" implica regredir para níveis demográficos da ordem do bilião no espaço de alguns anos ( se este número será ou não suficiente depende da monomania de cada sábio e dos crentes dispostos a seguir as variadissimas possibilidades alternativas que os sábios procurarão vender) estamos perante um cenário de tal forma apocalíptico ( Hitler, Staline, Mao, são responsáveis pela morte de meros milhões ou dezenas de milhões, aqui estamos a falar de uma escala de biliões...) que é fútil qualquer espécie de reflexão política.
Por outro lado, este alarmismo torna mais plausíveis soluções desesperadas como o nuclear e em menor grau os transgénicos. Se a alternativa é o desaparecimento de sete oitavos da humanidade em poucos anos, que espécie de louco recusará uma solução péssima desde que ela apareça como capaz de impedir a catástrofe imediata?
Talvez esteja aqui uma hipótese para se entender parte da discussão sobre a crise energética actual.

domingo, junho 08, 2008 

Os rabis, Olmert e a corrupção

O primeiro Ministro Olmert está já com os patins calçados para deixar o cargo por acusações de corrupção.
À primeira vista parece ser mais um caso de "justiça que funciona" que envergonha os vizinhos árabes de Israel, incluindo os da Autoridade Palestiniana, cujos lideres são normalmente notórios corruptos.
Quando se lê um bocadinho sobre o assunto, porém, percebe-se que a verdadeira razão pela qual Olmert vai ser corrido, não é por ser corrupto.
Olmert vai ser corrido pura e simplesmente porque, apesar de tudo o que tem feito é considerado uma "pomba" pelos seus compatriotas.
A "corrupção", se é que se pode considerar corrupto um político por receber 150.000 dólares ao longo de uma década, seja para fazer o que for, é só um pretexto fosco para substituí-lo por homens íntegros do calibre do sinistro Netanyahu.

 

Encruzilhada democrata

Finalmente Hillary deu o braço a torcer e admitiu uma derrota que era evidente há já algum tempo perante o outsider Obama, o candidato mistério mas cheio de "carisma".
Foi certamente um golpe pessoal muito violento.
O que é de lamentar neste caso é que não tenha sido ela a candidata democrata nas eleições de 2000 quando um Al Gore sem firmeza aceitou uma derrota fraudulenta e abriu caminho a uma época negra para os EUA, interna e externamente. Ela teria tido certamente uma posição muito mais firme.
Se ganhasse estas eleições Hillary significaria provavelmente uma politica externa mais centrista e em continuidade com os anos Bush, mas é de crer que internamente seria mais benéfica para os americanos.
Ele sabe que será suficientemente difícil enfrentar a máquina de investigação e produção de escândalos e fraudes que elegeu o Bush e estará ao serviço do seu adversário republicano, pelo que mostrar um mínimo de independência face à AIPAC seria suicídio político.
Mas essa necessidade de prestar vassalagem, mesmo que determinada por algum tacticismo na preparação do embate com McCain, evidencia a dependência total de qualquer presidente americano face ao governo israelita de quem recebe instruções quanto ao caminho a seguir no Médio Oriente, pelo que se torna difícil entender como vai Obama aplicar uma política mais dialogante e satisfazer as expectativas de muita gente à esquerda quanto a uma eventual inflexão na política externa americana.
Como vai ele "dialogar" com um país, o Irão, acerca do qual um político israelita definiu já que a prioridade é atacá-lo?
Uma coisa é ter-se oposto à guerra do Iraque, mas poderá ele retirar pura e simplesmente?
Se houver alguma diferença, e isso é ainda uma grande incógnita, será na política interna e será também uma questão de estilo. Por muito antagonismo que continuem a suscitar as políticas americanas, pelo menos constituirá algum alívio ver sairem de cena criaturas sinistras como Dick Chenney, Condolezza Rice e o resto da pandilha neoconservadora.

 

Tudo e o seu contrário

Em Portugal é líquido que existe um grau elevado de corrupção no futebol.
Pelo menos é a impressão com que se fica dirariamente da leitura dos artigos nos jornais.
É a impressão com que se fica diariamente das conversas de café e dos programas televisivos de comentário desportivo, normalmente mantidas num tom de exaltação moralista que chega a ser kitsch e anacrónico.
Mas quando finalmente um clube (e logo aquele que é normalmente o alvo das maiores suspeitas) é condenado em tribunal, surge logo, vinda não se sabe de onde uma legião de indignados defensores desse clube, com os argumentos mais idiotas.
É que ninguém proclama que esse clube está inocente.
As personalidades mais moralistas e circunspectas garantem que "os outros são piores", é por ser "um clube do Norte", e mesmo que "é para prejudicar Portugal"...
Enfim, isto é no desporto.
O pior é que na política, e em muitos outros aspectos da nossa vida pública e até particular também é assim.
E depois dizemos que estamos atrás dos nórdicos por culpa do Governo. De qualquer um deles.

 

Fuga para a frente

De regresso aos bons tempos dos artigos provocatórios, a Wired resolveu fazer um "número verde".
O espírito parece ser o "se não podes com eles, junta-te a eles" dos truques da propaganda neoconservadora especializada em virar os argumentos do adversário ao contrário.
Se, ao que parece, não pode já ignorar-se a constatação do aquecimento global, aqueles que ainda há pouco negavam ou ridicularizavam as suas evidências, investiram não na resolução dos problemas mas numa argumentação eficaz que justifique mais do mesmo.
Num feliz passe de prestidigitação, os maiores perigos ambientais tornaram-se assim "modelos de verdura".
É assim que se assiste hoje à campanha do relançamento da construção de centrais nucleares, a energia "verde" por excelência e à imposição de OGMs na alimentação como solução "verde" para os combustíveis e a fome.
Sempre numa linguagem interessante, apelativa e demagógica, o "dossier" apresenta o problema em 10 fichas, dentro das quais destaco:
a eleição do nuclear e dos transgénicos, as vantagens da agricultura industrial e da produção florestal sobre a agricultura biológica e as florestas virgens e a vantagem dos carros convencionais sobre os híbridos.
Há um ou outro ponto que me merece alguma reflexão:
- É inevitável que a China vai certamente adaptar-se a uma economia menos poluente. Resta saber se o fará com os conselhos da Wired e a tempo de provocar catástrofes ambientais numa escala que nós portugueses tão sensiveis às questões mais ridículas não conseguimos ter noção.
- Faz sentido que do ponto de vista ecológico ( e de outros) seja mais vantajoso viver nas cidades do que "no campo", geralmente eufemismo para a degradação do espaço suburbano materializada à conta da desculpa "verde" para a fantasia erótica da "vivenda individual com um jardinzinho".

 

Olha quem fala

O editorial do Público de ontem, Sábado dia 8 de Junho, aplica-se bem ao milagre Bush:
O texto completo do editorial, fechado a cadeado no Público, pode ser lido on line graças à solicitude do Bernardo Bollen Pinto do blog Debaixo do mesmo sol..., um admirador sincero do José Manuel Fernandes.

 

O crescimento ilimitado

A Wired é uma vibrante revista americana.
É uma tribuna dos apóstolos de uma espécie de capitalismo anarquista, libertário no que respeita a costumes e incondicional da ciência e de todas as novidades tecnológicas que tenta conciliar informação sobre tecnologia avançada, negócio e as boas causas da moda sem se enlear nas paranóias moralistas dos neoconservadores.
Nos anos 90 do boom económico da era Clinton, atravessou uma fase de euforia quando alguns dos seus editorialistas descobriram na configuração das forças produtivas marcada pela explosão da net, da globalização das então chamadas novas tecnologias e do comportamento brilhante em bolsa das empresas porta bandeira do movimento, muitas delas centradas em Silicon Valley, a concretização simultânea de um patamar acima do "fim da história" e do mito thatcheriano do "capitalismo popular".
Isto produziu delírios sobre a radiosa era de "crescimento ilimitado do mercado" que se seguiria, vertidos para artigos que fizeram época, como "The long boom" de Peter Schwartz e Peter Leyden e "New rules for the new economy", de Kevin Kelly, este último memoravelmente ridicularizado pelo circunspecto Paul Kruger nas páginas da Slate.
Das figuras da época merece referência especial o alucinado pastor evangelista do mercado livre, George Gilder, que fez fortuna a pregar a liberalização dos mercados e a vender conselhos de investimento na bolsa e acabou totalmente arruinado quando estoirou a bolha dotcom. Pelo menos, este pode gabar-se de ser um "liberal" coerente.
Passados cerca de 10 anos de tudo isto, com o planeta imerso numa série de crises graves vale a pena reflectir um pouco sobre o estilo messiânico e "de fronteira" que contaminou uma geração de ideólogos.
Uma passagem do artigo de Krugman sintetiza o estado de espírito dos "revolucionários".
As loucuras da Wired são relativamente benignas e agradáveis de ler, mas o mesmo não se pode dizer de outras consequências do sindroma Luke Skywalker.

sábado, junho 07, 2008 

A solução biológica

Segue link para um texto que julgo vai ao encontro de algumas ideias partilhadas pelo Manuel Rocha, embora a mim me pareçam, infelizmente, bastante utópicas.
Será que há uma esperança?

 

A privatização do ambiente

O cenário criado pela posição de Bruxelas sobre os projectos da costa do Alentejo em resposta a uma queixa da Quercus fundamentada num curto prazo, legitima um cenário de privatização dos negócios do ambiente e dá um ímpeto à desejada reforma da administração pública.
Se na realidade se verificar que após tanto tempo e tantas avaliações os órgãos da administração pública andaram a aprovar coisas ilegais, é legitimo esperar que esses organismos ligados ao ambiente e ao ordenamento do território sejam extintos, os seus funcionários passados à disponibilidade e as competências nos processos de ordenamento do território, avaliações ambientais e respectiva apreciação adjudicadas à Quercus ou outra qualquer associação ou empresa na área do ambiente.

 

O dilúvio

A Comissão Europeia solicitou recentemente esclarecimentos ao Governo Português sobre as condições em que teriam sido concedidos alvarás a uns projectos turísticos no litoral alentejano.
Isto foi motivo de festa para algumas pessoas.
A Europa, que quando dá jeito é perigosamente "neoliberal", representada neste caso por um grupo de pessoas não eleitas e circunstancialmente nomeadas para a Comissão, inquire o nosso Governo democraticamente eleito sobre o porquê da aprovação de projectos que representam a conclusão de processos analisados ao longo de anos durante várias legislaturas e avalizados por todas as instituições públicas e privadas com autoridade na matéria e as pessoas encaram isto com uma espécie de patética volúpia masoquista dando de barato que o Governo (este, porque é o mais recente, mas poderiam ser todos desde Cavaco a Sócrates passando por Guterres, Barroso (o actual presidente da comissão, não é ridículo?) e Lopes) que elegemos democraticamente e as instituições públicas que dele dependem ( com as autarquias que desde o início do processo tiveram executivos Ps e PC) são todas corruptas e tudo o que decidem é ilegal.
Esta questão irrita-me um bocado e não é por uma questão de patriotismo.
É porque significa que o pior da crise não é o aspecto material, é o estado de decadência mental e auto destrutiva de um País relativamente privilegiado que insiste em dar tiros no pé.

 

Aristocracia

Nos últimos tempos de hiper sensibilidade à questão ambiental e energética, se se houve falar no lançamento de alguma obra ou projecto, é incontornável o aparecimento de alguém em cena proclamando aos quatro ventos a ilegalidade do acto e avançando se necessário para os tribunais.
A anulação do projecto ou da obra em causa é normalmente recebida em sectores da blogosfera como uma vitória do bem contra o mal, já perfeitamente identificado por cronistas como o Miguel Sousa Tavares, como uma obscura "urdidura" parida por investidores, proprietários, empresários da construção civil, do imobiliário e outros, técnicos, advogados, consultores, Ministros e autarcas corruptos... "e demais oportunistas" parafraseando um célebre slogan do MRPP.
E ao ler a blogosfera e os comentários em artigos do Público ou do Expresso sobre questões ambientais, pensar-se-ia que o País vota mesmo MRPP.
O problema, é claro, não é o MRPP. O problema é a pobreza fransciscana de muitos desses comentários baseados em ignorância crassa e em preconceitos retrógrados embrulhados num léxico superficialmente esquerdista e moralista.
Os que exigem ao Governo que "não governe", sujestão "libertária" que na realidade significa que se pretende que intervenha na economia o necessário e suficiente para bloquear qualquer novo projecto seja de que natureza for e seja onde for, indiscriminadamente sem atender à legitimidade dos processos que os fundamentam (ou não), são os mesmos que exigem ao governo que "intervenha" para salvar os postos de trabalho das indústrias ou empreendimentos ou seja o que for que por qualquer razão (incluindo a fraudulenta, conceda-se) chegue ao fim do seu ciclo de vida.
Compreende-se que assim seja.
Os cidadãos de um País em grave recessão económica querem agora "desenvolvimento sustentável" se bem que ninguém saiba bem o que isso é.
Para uns é "business as usual", pretexto para os mais aberrantes atentados à natureza (incluindo o homem), como a tentativa de vender centrais nucleares como tecnologia "verde", para outros é uma fantasia kitsch onde encaixam a visão idílica e passadista de um País sem auto-estradas, sem fábricas, sem hotéis, sem aeroportos, sem grandes equipamentos desportivos e culturais, mas sim senhora, onde o mesmo cidadão continua a fazer a vida desafogada permitida pela sociedade afluente do início do século XXI, com os seus jornais, a sua internet de banda larga, TV cabo, tudo complementado pela viagenzita anual a um remoto turismo rural ou a uma qualquer praia mais ou menos frequentada, vogando através de uma paisagem de bilhete postal dos anos cinquenta polvilhada aqui ou ali pela presença tranquilizadora de uma ou outra vaquinha, uma que outra cabrinha, animada pela presença de um ou outro pastor alentejano ou beirão dando de longe vaia subserviente aos senhores da cidade. Um paraíso do lazer aristocrático ao alcance da "classe média".
Só fica por explicar o fascínio que ainda exercem sobre quase todos nós as grandes mega metrópoles dos países mais avançados que admiramos e invejamos.

 

Revolução ao café

A blogosfera, como a conversa de café, propicia o desenvolvimento de curiosos fenómenos de role play em que se assumem determinados papéis como se se representasse um drama ou se participasse num jogo do tipo second life.
É frequente ver pessoas, na sua maioria pacatos profissionais relativamente privilegiados assumirem posições incendiárias derivadas do radicalismo mais revolucionário em total contradição com o seu comportamento na vida diária.
O internauta só, frente ao teclado do computador, advoga frequentamente ideias e soluções em total contradição com o razoável pragmatismo que caracteriza a sua "realidade" mesmo que nela não se comporte necessariamente de forma alheia aos princípios que defende.
Sem se aperceber que a perspectiva intransigentemente revolucionária e militante em que muitas vezes se coloca é incompatível com comentários à esmagadora maioria das incidências políticas no interior do "sistema". O tema do comentário, só por si, o "desmascara".
Um revolucionário coerente com uma posição radicalmente anti-capitalista e anti-sistema encararia a maioria dos temas discutidos na imprensa e nos blogs com o mesmo desprezo ou indiferença com que um ateu assiste às discussões dentro da Igreja Católica sobre o celibato dos padres, a missa em latim e a ordenação das mulheres.
Por outro lado, a tentativa de observar a realidade de uma forma excessivamente construtiva, pretendendo encontrar o "equilíbrio" e rejeitar os "extremismos", arrasta-nos progressiva e subrepticiamente para posições conformistas e estéreis.
É esta dificil tensão que faz parte do interesse do exercício intelectual que é a blogosfera para os não alinhados. Reflectir com abertura e sem limites de programa mas simultaneamente sem perder uma certa lucidez e realismo.