sexta-feira, outubro 31, 2008 

O lado bom de Sarah Palin

O triunfo de Sarah Palin é o mais claro indício de que se atingiu um novo patamar na luta pela libertação da mulher.

O facto de uma pessoa cujo traço principal é o desejo de poder se ter convertido tão rapidamente numa das figuras a ter em conta na política americana dos próximos anos, dispensa de vez o discurso redutor e paternalista do tipo "se fossem as mulheres a mandar no Mundo..." e a necessidade de encontrar determinados traços de carácter que o estereótipo associa às mulheres para legitimar o argumento pela imprescindível e indiscutível igualdade de direitos, incluindo o desejo de Poder.

Nesse aspecto ela tem um papel mais importante do que Hillary Clinton, uma política legitimada porque "inteligente" e vagamente simpática à esquerda americana e europeia mas que por oportunismo não resistiu a cometer o profundo erro político e ideológico de jogar a cartada da "mulher".

As mulheres devem ter os mesmos direitos e deveres dos homens e ponto final, sem considerações sobre o seu carácter particular e independentemente das formas como esses direitos e deveres se exercem na vida de cada pessoa.

Em última análise esta questão só poderá ser entendida no dia em que seja plausível e "normal" conceber a existência de um Pinochet mulher ainda que nos repugne a figura e devamos fazer tudo para impedir tal cenário.

Sarah Palin, não é certamente um Pinochet, embora a possibilidade de vir a ocupar o cargo de Presidente americano torna plausível que possa vir a controlar uma capacidade de destruição com que o repulsivo chileno nunca poderia sonhar; é apenas uma lider populista e ambiciosa que como qualquer líder populista e ambicioso se agita freneticamente para concretizar a sua ambição, e é nesse perfil neutro do ponto de vista do género que reside a sua grande vantagem como afirmação da igualdade de direitos entre os sexos.

quinta-feira, outubro 30, 2008 

Boas cores

"uma pessoa suicidou-se na linha amarela" disse a encantadora mulher sentada na mesa do fundo do café, "felizmente que não me causou transtorno porque eu uso a linha azul".

sábado, outubro 25, 2008 

Disfunções

É bizarro comparar o tom escapista e eufórico da publicidade dos principais meios de comunicação com o conteúdo da informação que essa publicidade financia.
Página sim, as notícias, os editoriais, as crónicas alertam-nos, recriminam-nos, intimam-nos e ameaçam-nos. Página não, a publicidade propõe-nos o luxo e a fantasia, se for preciso a crédito. Sempre tudo fácil, seguro e feliz.

 

Mãozinhas no fogo?

Paulo Campos, o Secretário de Estado adjunto das Obras Públicas garantiu no Expresso da Meia Noite de ontem, que os financiamentos das Obras Públicas previstas, foram estudados para "o pior cenário".

 

Consciência ecológica

A populaça está preocupada "com o ambiente", a populaça está disposta a matar pela "defesa do ambiente".
Depois de uma negociata qualquer que envolveu a reparação parcial do pavimento como "contrapartida" de um evento publicitário promovido por uma marca de automóveis, a Câmara de Lisboa fechou hoje a principal avenida da cidade, a Avenida da Liberdade, ao trânsito automóvel.
Com que objectivo? Para que pudessem desfilar outros automóveis, de competição.
Uma lição de democracia automóvel, portanto.
Os lisboetas, pois claro, acorreram ávidos. Automóveis. Tratava-se de ver automóveis.
Onde estava a Quercus? Onde estavam os "verdes"?
Não há crise.
Um dia destes a Câmara fecha a Avenida para outra patuscada qualquer, o Dia Europeu sem Carros, o Dia do Triciclo, outra coisa qualquer, assim resgatando incólume a consciência ecológica do cidadão lisboeta e do burocrata camarário.

 

O sonho americano

Casas a $1,00. Onde é que já se viu tamanha prosperidade? Altura para aqueles que passaram os últimos anos a tentar impingir-nos o "modelo" atravessarem o Atlântico e porem em prática as suas fantasias.

domingo, outubro 19, 2008 

Um equívoco

Afinal sempre assisti à conferência do Kunstler realizada na Gulbenkian na quinta feira de manhã.
A Conferência intitulou-se : "A longa emergência: o futuro da energia e do urbanismo" e foi organizada pela Comissão de Coordenação Regional de Lisboa e Vale do Tejo (CCDR-LVT).
Tal como era previsível, tratou-se de um equívoco.
A mensagem de Kunstler resume-se basicamente a isto:
A civilização ocidental vai pagar rapidamente e numa escala catastrófica uma série de erros cometidos no último século e meio. Os problemas derivados da escassez do petróleo implicarão a passagem de um paradigma de desenvolvimento em que sobrevivem cerca de sete biliões de pessoas no planeta para um outro em que se estima que possam sobreviver de uma forma "harmoniosa" cerca de dois biliões (e a experiência histórica mostra-nos os limites dessa harmonia).
Porém, o problema tal como é apresentado por Kunstler, é de uma dimensão tal, que encará-lo transcende qualquer abordagem de natureza política.
É pura e simplesmente o salve-se quem puder, o regresso à barbárie.
Kunstler bem pode fazer algumas críticas pertinentes a diversos aspectos do desenvolvimento económico e industrial e das suas implicações no urbanismo e inevitáveis referências à crise financeira global. Não tem é ideia nenhuma ao que se pode fazer a seguir. Ou melhor, a ideia que tem é que vai haver uma catástrofe, ponto final. Nada de construtivo, portanto.Quando leio o registo vagamente triunfalista de algumas pessoas que parece acreditarem piamente que tudo isto se vai passar assim antecipando com deleite a catástrofe anunciada, pergunto-me se estas pessoas têm consciência de que se este cenário merece alguma credibilidade não é só o sistema desumanizador do capitalismo que está em causa. É toda a nossa civilização, toda a nossa cultura, incluindo a infra-estrutura intelectual sobre a qual se articula a crítica ao "sistema". O sistema não pode decompor-se meramente por "sectores".

Qual é, neste cenário, a margem deixada para o "planeamento" e a "adaptação" da nossa civilização?
Qual é, neste contexto, o interesse do seu contributo para quem quer reflectir sobre estes temas? Em que direcção é possível e necessário influenciar através do debate político quem tem poder de decisão?
A única utilidade deste algo surpreendente convite poderá estar no aproveitamento que alguns malabaristas tentam fazer do medo gerado pela proximidade do apocalipse para forçarem soluções milagrosas, em particular o "debate" do nuclear. Basta notar que um dos participantes da conferência de Kunstler na ACL foi o inevitável Mira Amaral.
Com efeito, só não é surpreendente a presença de Mira Amaral como orador num evento em que intervem como artista convidado um pensador tido como marginal e radical, porque o pensador marginal e radical é ele próprio um defensor do nuclear como forma de minorar a crise, uma posição de resto absurda à luz do próprio cenário por si pintado. Num mundo em que o sistema político se desagrega, onde estão os recursos necessários e a estabilidade política indispensável para a segurança necessária à construção e operação de centrais nucleares para já não falar da evidente contradição de se admitir uma solução pesada e centralizadora para o problema energético quando todo o discurso anterior apontara para o "local", o descentralizado, o fragmentado e o distribuído.

 

Machadada Final?

domingo, outubro 12, 2008 

Vício

O Vício de um certo jogo, a paixão pela política. Este vai ser certamente um dos sites que mais visitarei durante o próximo mês.

 

Success story

Porta aberta para o sucesso e a criação de "riqueza".
Riqueza também para o "povo", capitalismo popular.
A glória do egoísmo mais abjecto.
A herança dourada de Thatcher e Reagan.

 

Hipócritas desprezíveis

Quarenta biliões de libras é quanto estão neste momento a pedir ao Estado quatro grandes bancos britânicos para assegurarem a sua sobrevivência...
Se houvesse alguma moralidade, os gestores dos grandes bancos da City deveriam acabar na mais abjecta miséria condenados a ouvir as suas próprias tiradas arrogantes dos tempos das vacas gordas sobre os "losers", os miseráveis arruinados pela odiosa Margaret Thatcher e seus seguidores. Como os conservadores gostam de garantir que não há moralidade e a "natureza humana", "é assim", ei-los "ao tio, ao tio" despudorado a pedir ao Estado (esse mesmo, o dos "reguladores ditatoriais") o dinheiro dos "contribuintes", a cujo grupo pertencem quando se trata de se indignarem com os gastos "supérfluos" de natureza social.

 

Cisne Negro

Afinal não foi o choque das civilizações, o terrorismo islâmico, a imprensa "liberal", a degenerescência dos costumes ou a Rússia a invadir os seus vizinhos.
Foram os próprios mecanismos do sistema financeiro que levaram à presente crise que vivemos.
Um gajo houve que teorizou sobre o caso há pouco mais de um século e é, desde que me lembro, semanalmente anunciado como "morto" pelos intelectuais  e comentadores.

 

Sempre para pior

Para a seita do Bush a rotina "good guys, bad guys" tinha intuitos essencialmente propagandísticos. 
Em Sarah Palin, esse tema tornou-se na essência  do discurso.
Depois de tanto "idealismo" a propagar democracias e a "construir nações", os conservadores conseguem assim confirmar as suas próprias teses sobre a inexistência de progresso.

 

Motivos de esperança

James Kunstler, o celebrado autor de "O fim do Petróleo", vem a Portugal na próxima sexta feira dia 17 de Outubro dar uma conferência a convite do jornal Meios & Publicidade e da Associação Comercial de Lisboa.

Por 50 ou 75 Euros, os portugueses interessados terão oportunidade de receber em directo algumas dicas úteis sobre a catástrofes inevitáveis que se aproximam com o fim do petróleo.
A presente débacle financeira é apenas uma pálida antevisão do que se aproxima.
A mais geral e quiçá definitiva aproxima-se a largos passos com a escassez do petróleo e de outros recursos de que depende o "nosso modelo de desenvolvimento", se é que assim se lhe pode chamar.
Ambas têm raízes num tipo de urbanização que incentivou com êxito a total dependência do automóvel, i.e., dos combustíveis.
Por algum motivo, a débacle financeira, apesar de ter conduzido a curto prazo a uma diminuição do preço do petróleo, parece também impotente para minimizar a médio e longo prazo as expectativas de consumo que fundamentam os modelos do fim do petróleo... antes pelo contrário, agravam a crise energética.
O facto de a Associação Comercial de Lisboa ter convidado Kunstler por se tratar de um especialista "numa matéria que faz parte da ordem do dia por ser determinante para o desenvolvimento das empresas neste século" releva de algum equívoco, já que a mensagem dele se pode resumir a que as empresas, ou pelo menos as empresas do tipo das representadas pela ACL vão provavelmente desaparecer bem cedo neste século.
Há no entanto razões para esperança?
Sim, se atendermos a que Kunstler se arrisca a atravessar o Atlântico de avião para trabalhar (gastando gasosa, emitindo CO2, hyper long distance commuting, etc..) , quinze dias depois de ter previsto para a passada sexta feira dia 10 de Outubro o seguinte cenário:


Haja Deus...
fotografia: imagem parcial de um trabalho do Malia Poppe

 

Quem não tem cão caça com gato

Em dificuldades nas sondagens o ticket Republicano recorre ao que melhor tem para oferecer: o ataque pessoal, a calúnia barata e os "escândalos" de última hora.
Isto na mão direita. Na esquerda, planos mirambolantes para "salvar a economia", tão mais radicais e "esquerdistas" quanto menos são para cumprir.
Os conservadores mais sofisticados, em particular os europeus, deleitam-se com o arrepio que provoca aos democratas americanos e à esquerda europeia, o fascínio que uma populista reles como Palin causa ao labrego da chamada "América profunda", um eufemismo que de resto tem o seu lugarinho à parte na história do talentoso e bem sucedido marketing conservador.
É um fenómeno recorrente, em Portugal acontece o mesmo com o Alberto João Jardim, ainda que, para sermos rigorosos, este faça figura de Nobel da Literatura perante a Governadora do Alaska, mas intriga-me ver esses conservadores sofisticados indiferentes, apenas por motivos de puro oportunismo ideológico, ao facto de a presente candidatura republicana se ter transformado num exercício de arqueologia cultural, particularmente perigoso porque se trata de disputar o poder na mais poderosa nação do planeta.
A escolha torna-se cada vez mais entre a América "normal" personificada por Obama, com todas as suas qualidades e defeitos, sem lugar para as disparatadas expectativas da esquerda europeia, e algo de imprevisível e sempre para o pior.
O consulado de Bush foi sinistro e sinistro é o seu legado.
Mas Bush foi o semi-idiota útil nas mãos de um grupo de personagens intelectualmente estruturados e com ideias bem claras quer quanto a política interna como a externa. Pode entender-se o fascínio que a seita do Bush exerce sobre alguns conservadores europeus.
Mas McCain procurou descolar da imagem de Bush da forma mais literal e portanto mais oportunista e reveladora da sua própria incapacidade para criar um conteúdo alternativo e estruturado dentro do espaço conservador. A sua escolha de Palin, a criatura que ameaça engolir o criador e cujo sucesso ilustra a ambiguidade da telegenia, revelou inconsciência pessoal e política.
McCain tornou-se num zero, e Palin tornou-se na campanha e no programa, sintomaticamente incensada por personagens como o Rush Limbaugh.
Que McCain surja ainda com hipóteses nas sondagens é um sintoma preocupante.

 

Chota (2 meses)

A evolução das espécies

terça-feira, outubro 07, 2008 

À tripa forra

Na minha ignorância do que os economistas chamam de "comportamento racional", parece-me disparatado o conselho que alguns dão às pessoas para terem cuidado com o crédito, e fazerem poupanças. Tal como as coisas estão, o que parece racional é fazer o contrário: estoirar as poupanças nos produtos mais fúteis que se imaginar e rápido, enquanto é tempo. As poupanças vão ficar reduzidas a pó e a futilidade é bem possível que acabe, pelo menos para muita gente e durante bastante tempo.
Será este o raciocínio que levou à inesquecível erupção criativa da Berlim nos anos 20/30?

 

Deixem-se estar quietinhos

Diversos economistas de vulto cá do burgo elogiaram o bom senso do Ministro das Finanças ao "garantir" que os depósitos dos portugueses estão cobertos.
Há que actuar no sentido de evitar o pânico...
O problema deste raciocínio é que decorre do anacronismo de os "especialistas" pensarem que o Ministro das Finanças está a falar para "o povo".
Esquecem que o povo de hoje é constituido por uma massa heterogénea de energúmenos que têm de comum entre si o facto de estarem expostos a muito mais informação, e sobretudo o facto de estarem escaldados com as "garantias" dos políticos e dos gurus da economia.
O pessoal já os topa, e sabe que quando o Ministro das Finanças tem de vir fazer uma declaração destas é porque algo está de tal modo grave que é necessário "evitar o pânico".
Eu, por exemplo, fiquei em pânico com estas afirmações do Ministro e sobretudo com os comentários dos experts que na parolice da tentativa de se armarem em mais sábios do que o comum dos patolas, enterraram completamente a intervenção do Ministro.
Só não vou já ao Banco a correr levantar as minhas parcas economias porque na realidade, se o assunto é mesmo sério, não vai valer de nada. A ninguém.

 

Pânico e demagogias

Tal como por duas décadas a demagogia "anti-regulação" debitada por uma plêiade de "especialistas" e "gurus" cavou o buraco que ameaça demolir o sistema financeiro internacional, o pânico gerado pela ânsia de salvação deu força ao argumento demagógico da moda, a diabolização da "desregulação" dos mercados, sem que ninguém perceba exactamente o que é que isso quer dizer.
Nos EUA, as forças políticas que prosperaram à conta da demagogia "do Mercado" encontram-se agora encurraladas e à mercê, esbracejando descontroladamente em busca de qualquer coisa, qualquer coisinha mesmo, que "pegue". O que durante anos foi para alguns comentadores a ilustração do milagre da livre iniciativa privada sem restrições capaz de concretizar o "sonho americano", tornou-se agora, na voz do mesmos, a evidência da "ganância" das "classes médias" vivendo despudoradamente "acima das suas posses", um argumento aliás, a que os portugueses já estão habituados porque desde há muito que é avançado pelos "libertários" "deste País" quando se trata de criticar a "excessiva" despesa pública em questões básicas e essenciais como a saúde e a educação.
Quem diria, o voraz consumidor "glorioso" que "dinamizava" a economia passou num ápice a nefelibata criminosamente irresponsável .
Desafiando qualquer lógica, (e é esse o problema presente dos Republicanos) os únicos inocentes nesta história parece serem os gestores dos grandes bancos, os especuladores, os yuppies de Wall Street, porque é tudo culpa dos "idealistas de esquerda" da administração Clinton como coaxam os conservadores.
É culpa "dos reguladores", ressoa deste lado do mar um ridículo José Manuel Fernandes, praticamente no dia em que o Bush se encheu de pragmatismo e deitou mãos à obra com um programa de intervenção estatal, algo, por exemplo, que parece inconcebível, para mal dos nossos pecados, na "estatista" e "centralista" Europa.
É claro que a democracia é também um sistema clientelar, pelo que não pode haver demasiada expectativa relativamente ao comportamento futuro dos EUA, quer ganhem Republicanos ou Democratas. Mesmo que ganhe, Obama, para além de atascado nas crises económica e energética e nos lamaçais do Médio Oriente e do Afeganistão, não pode esquecer que governa um País onde é concebível que uma aberração política chamada Sarah Palin ( a patusca cheer leader das hockey mums que é uma deliciosa lufada de ar fresco populista e labrego no submundo das "ideias" do neoconservadorismo americano e dos seus proxys europeus) tenha sequer a possibilidade de ocupar a Vice-Presidência, para não falar da Presidência.
A hipotética vitória de Obama, mesmo que conseguida à custa de "demagogia" e mesmo que não traga outras alterações de fundo, sendo que a única alteração de fundo que podemos dar por certa, fruto das acções concorrentes da aguerrida seita do Bush e da "normal" evolução histórica, consiste na diminuição da influência dos EUA no mundo, só pode trazer de positivo a mudança para um estilo mais civilizado que permita talvez aliviar algumas tensões políticas e militares existentes em diversos pontos do planeta. E não será pouco...