domingo, novembro 21, 2010 

Lamechices da treta

Quando oiço propósitos acerca da "harmonia entre o homem e a Nat'reza antes da revolução industrial", lembro-me desta passagem das memórias do exporador britânico Thomas Cavendish do século XVI citada por Robert Kerr, Voyages and Travels e reproduzida no magistral artigo de Hans Magnus Enzensberger, A Theory of Tourism:
O Senhor foi suficientemente generoso para me deixar circum-navegar o globo.
Nessa viagem descobri todos os lugares dos mundos conhecidos da Cristandade ou, pelo menos, recolhi informação acerca deles. Naveguei ao longo das costas do Peru, do Chile e da Nova Espanha e encontrei ricas presas por todo o lado. Queimei e afundei quatorze navios de vela, pequenos e grandes. Queimei e pilhei todas as aldeias e cidades onde puz os pés. (1)
A "harmonia entre o Homem e a Natureza" é um conceito contemporâneo, só possível de alcançar numa sociedade que percorreu uma história e necessita dele como base de sobrevivência numa "natureza" em larga medida "humanizada".
Antes disso nunca existiu esse conceito. Era, talvez, a condição, nunca reflexão, dos primeiros hominídeos, antes de a humanização da natureza ter sido iniciada pela capacidade de criar artefactos, muito antes da decoberta do fogo e da invenção da roda, ou da agricultura.
Basta, portanto, de discursos lamechas e mitificadores e mistificadores do passado, reaccionários.
A ecologia é uma consciência do presente, alicerçada em ciências do presente, só possível pelo caminho que foi percorrido e que deverá ter como objectivo o progresso social, cultural e material da humanidade, nada mais.

(1) O original é:
The Lord was kind enough to let me circle the globe. On this journey I have discovered all places of the worlds known to Christianity or at least gathered information about them. I sailed along the coasts of Chile, Peru, New Spain and found rich booty everywhere. I burnt and sank fourteen sail boats, small and big. I burnt and plundered all villages and cities in which I set foot.

 

Nuclear, sempre tudo tranquilo

Pronto, já sabemos que a justiça chinesa funciona segundo regras que não são exactamente as regras daquilo que consideramos um Estado de Direito em Democracia. Ainda que muita gente em Portugal, da esquerda à direita ache que a justiça portuguesa deveria funcionar (em certos casos) do mesmo modo, e os nostálgicos do anterior regime considerem que Estado de Direito é o estado que "existe" ou, até melhor, "que existia".
Mas como não há "fumo sem fogo" (não é o que dizem?), é notícia tranquilizadora (ou tranquilizante?) na pág. 23 do Público de ontem, Sábado, que:
O ex-director da principal empresa estatal nuclear da China viu ontem confirmada a condenação a pena perpétua, pelo crime de suborno, no âmbito de uma campanha anticorrupção que está a mudar os líderes do sector no país.
E prontos, está resolvido e é claro: o nuclear, em si, é ferpeito, o pior é o factor Ó mano...
(claro que estas coisas só são passíveis de acontecer na China, é que eles não são como nós...)

 

Finalmente

Saravah! Michel Giacometti.
Eu sei que há a crise, mas o FMI que se lixe porque é ILEGAL perder este trabalho fundamental.
Nossas raízes, som e imagem, o último testemunho do Portugal Antigo, obtido poucos segundos antes de ter desaparecido para sempre.

sábado, novembro 20, 2010 

Obama no Far West... da Europa

 

Favorite corner


Passo frequentemente por aqui a pé, a caminho do trabalho, por vezes congeminando posts brilhantes e arrasadores e definitivos no blog que corre permanentemente pela minha cabeça, com multimédia variegada e comentários e tudo.
O sítio não tem aparentemente nada de especial, prédios de "pato bravo" decadentes num trecho de rua estreita, quase permanentemente na sombra a partir dos primeiros alvores, insinuam-se o abandono e a ruína, escorrem humidades pelas paredes, cresce, nalguns sítios, o musgo...
Excepto que dele emana uma certa densidade psicogeográfica que me atrai e faz dele, não sei bem porquê, um dos meus conjuntos favoritos da cidade.
Um dia destes, dispensando petições da Ordem dos Arquitectos, será irremediavelmente siderado para dar lugar a um mamarracho ao estilo dos actuais prémios Valmor, aberrações forradas a granito rosa capazes de ressuscitar o próprio Visconde, para que ele se possa suicidar honradamente e em paz como reparação simbólica das barbaridades que se têm homenageado em seu nome e que literalmente o comeram por dentro, apenas deixando uma carcaça desfigurada, metáfora cruel das "reabilitações" costumeiras naquela zona.

 

É preciso avisar toda a gente

A Mafia do Vento mistificou mais um... agora parece que é mesmo certo que as renováveis vão arruinar o Planeta.

quinta-feira, novembro 18, 2010 

Mira'mbulante

É curioso ver os jornais "de referência" preocupados com a indemnização a um motorista com 30 anos de serviço (Jesus, pode lá ser tanta massa, parece que ainda por cima foi o homem quem pediu para sair, e é "apontado" - esta mata-me - como sendo "do PS"...é óbvio que deveria ter ido para casa a seco, o magano... ) quando acolhem pacatamente e com regularidade, nas suas colunas, gente de outro calibre, amplamente mandatada para discursar com autoridade sobre os problemas da "despesa pública", subentendendo-se que para reduzir despesas, há que cortar nas indemnizações chorudas... dos motoristas... é que nesta hora de sacrifícios, há que exigi-los a "todos"...
Que se note que o caso linkado neste post, é apenas um entre a plêiade de homens públicos preocupados com a "despesa pública". Uma certa camada de patriotas de gema a quem o País tanto deve, mas que não deixa, porém, nos momentos decisivos, os seus créditos por mãos alheias ao reclamar para si  todas as regalias despesistas previstas nas laxistas Leis que o decadente Estado Social produziu para proteger a quem trabalha, no intuito vão (e economicamente irracional) de promover um módico de distribuição de riqueza.
E merecem. Afinal, quem, mais do que eles, trabalhou? E trabalha, acumulando com as reformas? Não tenhamos dúvida. A despesa (agora), tem de ser bem controlada.

terça-feira, novembro 16, 2010 

Não está bonito

A mim, parece-me que estamos a entrar num período em que os aspectos mais sinistros da "vigilância popular" virão ao de cima. O "inimigo principal", não é já tanto "o capitalismo", é o vizinho do lado.
O resultado deste tipo de "vigilância", não é, em geral, saudável, nem para a democracia, nem para a transparência, nem para o rigor nas contas públicas, nem para a melhor distribuição da riqueza.
O resultado é o autoritarismo no topo, e "dog eats dog" entre a arraia miúda.
Isto a propósito da indemnização a um funcionário da EPAL, por rescisão de contrato, uma historieta, entre tantas, sintomática do momento que vivemos, que salta já dos contrafundos javardosos do "Correio da Manhã para os destaques dos jornais "de referência" certamente incapazes de resistir ao detalhe picante de o funcionário em questão ser "apontado" como militante socialista e ser casado com uma funcionária do PS.
Só um detalhe para se perceber como funciona esta gente:
a notícia do Público começa por dizer que a indemnização foi três vezes superior ao previsto no contrato. Depois esclarece ( ? - francamente não sei o que a lei prevê, aqui limito-me a reproduzir como válida, sob sérias reservas, a informação veiculada por estes trapalhões compulsivos ) que foi "superior ao que a lei do trabalho prevê, no mínimo 1,5 salários por ano"  e acrescenta que o sujeito recebeu "mais de três salários".
A indemnização foi, assim, aparentemente, o dobro dos 1,5 "mínimos", e o jornal diz que foi o triplo.
Resta saber, como é que isto se tornou notícia: certamente através de um bufo qualquer que a ventilou ao Correio da Manhã. E o jornal "de referência", copiou do Correio da Manhã.
Volta Stasi, volta Pide, está tudo perdoado.

sábado, novembro 13, 2010 

E ao contrário?

Quer dizer que cerca de 60% acredita que não entrará.
Se apenas um terço  dos investidores (e quando digo apenas não estou a ignorar as circunstâncias e as consequências de tal se verificar) "acredita" no incumprimento, porque é que tantos analistas nos pretendem fazer crer que isto quer dizer que ele se verificará? Porque é que os analistas que tanto acreditam no "mercado", acreditam mais nos trinta por cento do que nos sessenta por cento?
E se fosse ao contrário, isto é, se cerca de 60% acreditassem no incumprimento da dívida por parte de Portugal?

quarta-feira, novembro 10, 2010 

Afinal...

Mais postos de trabalho em perspectiva para alguns especialistas portugueses em matéria de energia.
A Agência Internacional de Energia necessita deles. Urgentemente. Para fazer contas.
É que a acreditar numa notícia do Público on line de ontem, a AIE divulgou recentemente resultados que sugerem que "Os subsídios aos combustíveis fósseis em 2009 superaram, a nível global, os apoios às energias renováveis em mais de cinco vezes"... o que é totalmente contraditório com o que esses especialistas  têem vindo a trombetear (e, mais recentemente, também alguns comentadores a leste do assunto mas para quem tudo o vem à rede é peixe, como arma de arremesso político contra o Governo), cá em Portugal e noutros países, acerca da ruína que constituirão (em particular, para "as famílias") os subsídios às energias renováveis.
Será mesmo assim? Será que a AIE agora também foi tomada de assalto pela tropa do Sócrates? Será que os resultados foram encomendados pela "mafia do vento"?

sexta-feira, novembro 05, 2010 

A cabeça fria, vale tudo menos tirar olhos para vender papel, ou : quem é que ganha com isto?

Recebi hoje de manhã, com pânico, as notícias veiculadas por vários meios de comunicação de que o FMI diz que a falência de Portugal é quase certa.
Verifiquei depois que a notícia se baseou num artigo ontem publicado no i-online, intitulado "FMI lamenta falência "quase certa" de Portugal".
O artigo seria baseado num relatório do FMI intitulado "Fiscal Monitor"  recentemente publicado (também em pdf que pode descarregar-se, livremente, da net).
Como já sei do que o "nosso" "jornalismo" gasta, fui à procura do tal relatório do FMI, por me parecer absurdo que o FMI, por muito tenebrosa que seja a sua imagem, declarasse assim a "falência" de Portugal, pelo simples facto de a anunciar na presente conjuntura.
Eis  o excerto da página 30 do tal relatório, que inspirou a notícia:

"Market views on fiscal developments, as reflected in bond yields and spreads, are becoming more polarized. Yields have declined in countries regarded as safe, or at least safer, havens, while they have increased (and spreads have widened) for a few countries that are considered to be more at risk. This increased polarization does not seem to reflect changes in fiscal fundamentals, but rather a global shift in market sentiment. In the case of emerging markets, strong fundamentals, combined with search for returns, have continued to support buoyant capital inflows, leading to declines in sovereign bond yields.

Increased pessimism has affected some euro area countries. Sentiment stabilized in May–June in countries under market pressure (Greece, Ireland, Portugal) with the creation of the European Financial Stability Facility (EFSF), actions by the European Central Bank (ECB) under the Securities Markets Program (SMP), and the launch of Greece’s program supported by EU-IMF financing. However, investor concerns have reemerged more recently (Figure 2.7a). This is despite the fiscal outlook in Greece and Portugal improving at a faster-than-expected rate. Indeed, some market analysis regards a credit event in some advanced countries as almost certain "

Uma coisa é estarmos habituados à linguagem eufemistica do FMI que esconde geralmente perspectivas sinistras sob palavras mansas, muito bem ponderadas.
Outra é tirarmos conclusões sensacionalistas que não sendo sequer rigorosamente objectivas, mas sim ilações abusivas, não se atinge que espécie de propósito podem servir para além de ajudarem a lançar pânicos e boatos, e, talvez, vender (a muito curto prazo) jornais e audiências. Há ainda a hipótese, bastante plausível, de o jornalista que assina o artigo, e os que o copiaram, não perceberem bem o que estavam a ler e acharam que "não interessa, é parecido"...
Tentando uma leitura objectiva, o que se diz é que a situação em Portugal e a Grécia está a melhorar a um ritmo superior ao antecipado, mas ALGUMAS análises de mercado vêem como certo o que designam como "credit event", isto é, uma situação de incumprimento da dívida num dos "países avançados". Sem especificar Portugal, embora seja perceptível, dados os "eventos" dos últimos dias, que Portugal seja um dos alvos dessas "análises".
Por outro lado, não vi rigorosamente nenhum "lamento" do FMI.