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domingo, outubro 19, 2008 

Um equívoco

Afinal sempre assisti à conferência do Kunstler realizada na Gulbenkian na quinta feira de manhã.
A Conferência intitulou-se : "A longa emergência: o futuro da energia e do urbanismo" e foi organizada pela Comissão de Coordenação Regional de Lisboa e Vale do Tejo (CCDR-LVT).
Tal como era previsível, tratou-se de um equívoco.
A mensagem de Kunstler resume-se basicamente a isto:
A civilização ocidental vai pagar rapidamente e numa escala catastrófica uma série de erros cometidos no último século e meio. Os problemas derivados da escassez do petróleo implicarão a passagem de um paradigma de desenvolvimento em que sobrevivem cerca de sete biliões de pessoas no planeta para um outro em que se estima que possam sobreviver de uma forma "harmoniosa" cerca de dois biliões (e a experiência histórica mostra-nos os limites dessa harmonia).
Porém, o problema tal como é apresentado por Kunstler, é de uma dimensão tal, que encará-lo transcende qualquer abordagem de natureza política.
É pura e simplesmente o salve-se quem puder, o regresso à barbárie.
Kunstler bem pode fazer algumas críticas pertinentes a diversos aspectos do desenvolvimento económico e industrial e das suas implicações no urbanismo e inevitáveis referências à crise financeira global. Não tem é ideia nenhuma ao que se pode fazer a seguir. Ou melhor, a ideia que tem é que vai haver uma catástrofe, ponto final. Nada de construtivo, portanto.Quando leio o registo vagamente triunfalista de algumas pessoas que parece acreditarem piamente que tudo isto se vai passar assim antecipando com deleite a catástrofe anunciada, pergunto-me se estas pessoas têm consciência de que se este cenário merece alguma credibilidade não é só o sistema desumanizador do capitalismo que está em causa. É toda a nossa civilização, toda a nossa cultura, incluindo a infra-estrutura intelectual sobre a qual se articula a crítica ao "sistema". O sistema não pode decompor-se meramente por "sectores".

Qual é, neste cenário, a margem deixada para o "planeamento" e a "adaptação" da nossa civilização?
Qual é, neste contexto, o interesse do seu contributo para quem quer reflectir sobre estes temas? Em que direcção é possível e necessário influenciar através do debate político quem tem poder de decisão?
A única utilidade deste algo surpreendente convite poderá estar no aproveitamento que alguns malabaristas tentam fazer do medo gerado pela proximidade do apocalipse para forçarem soluções milagrosas, em particular o "debate" do nuclear. Basta notar que um dos participantes da conferência de Kunstler na ACL foi o inevitável Mira Amaral.
Com efeito, só não é surpreendente a presença de Mira Amaral como orador num evento em que intervem como artista convidado um pensador tido como marginal e radical, porque o pensador marginal e radical é ele próprio um defensor do nuclear como forma de minorar a crise, uma posição de resto absurda à luz do próprio cenário por si pintado. Num mundo em que o sistema político se desagrega, onde estão os recursos necessários e a estabilidade política indispensável para a segurança necessária à construção e operação de centrais nucleares para já não falar da evidente contradição de se admitir uma solução pesada e centralizadora para o problema energético quando todo o discurso anterior apontara para o "local", o descentralizado, o fragmentado e o distribuído.

Certo !

E entretanto são depreciadas as reorganizações económicas de base regional como se remetessem para niveis de planeamento cuja aparente simplicidade é encarada como um género de retrocesso em relação aos supostos avanços do pensamento económico.

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