Pânico e demagogias
Tal como por duas décadas a demagogia "anti-regulação" debitada por uma plêiade de "especialistas" e "gurus" cavou o buraco que ameaça demolir o sistema financeiro internacional, o pânico gerado pela ânsia de salvação deu força ao argumento demagógico da moda, a diabolização da "desregulação" dos mercados, sem que ninguém perceba exactamente o que é que isso quer dizer.
Nos EUA, as forças políticas que prosperaram à conta da demagogia "do Mercado" encontram-se agora encurraladas e à mercê, esbracejando descontroladamente em busca de qualquer coisa, qualquer coisinha mesmo, que "pegue". O que durante anos foi para alguns comentadores a ilustração do milagre da livre iniciativa privada sem restrições capaz de concretizar o "sonho americano", tornou-se agora, na voz do mesmos, a evidência da "ganância" das "classes médias" vivendo despudoradamente "acima das suas posses", um argumento aliás, a que os portugueses já estão habituados porque desde há muito que é avançado pelos "libertários" "deste País" quando se trata de criticar a "excessiva" despesa pública em questões básicas e essenciais como a saúde e a educação.
Quem diria, o voraz consumidor "glorioso" que "dinamizava" a economia passou num ápice a nefelibata criminosamente irresponsável .
Desafiando qualquer lógica, (e é esse o problema presente dos Republicanos) os únicos inocentes nesta história parece serem os gestores dos grandes bancos, os especuladores, os yuppies de Wall Street, porque é tudo culpa dos "idealistas de esquerda" da administração Clinton como coaxam os conservadores.
É culpa "dos reguladores", ressoa deste lado do mar um ridículo José Manuel Fernandes, praticamente no dia em que o Bush se encheu de pragmatismo e deitou mãos à obra com um programa de intervenção estatal, algo, por exemplo, que parece inconcebível, para mal dos nossos pecados, na "estatista" e "centralista" Europa.
É claro que a democracia é também um sistema clientelar, pelo que não pode haver demasiada expectativa relativamente ao comportamento futuro dos EUA, quer ganhem Republicanos ou Democratas. Mesmo que ganhe, Obama, para além de atascado nas crises económica e energética e nos lamaçais do Médio Oriente e do Afeganistão, não pode esquecer que governa um País onde é concebível que uma aberração política chamada Sarah Palin ( a patusca cheer leader das hockey mums que é uma deliciosa lufada de ar fresco populista e labrego no submundo das "ideias" do neoconservadorismo americano e dos seus proxys europeus) tenha sequer a possibilidade de ocupar a Vice-Presidência, para não falar da Presidência.
A hipotética vitória de Obama, mesmo que conseguida à custa de "demagogia" e mesmo que não traga outras alterações de fundo, sendo que a única alteração de fundo que podemos dar por certa, fruto das acções concorrentes da aguerrida seita do Bush e da "normal" evolução histórica, consiste na diminuição da influência dos EUA no mundo, só pode trazer de positivo a mudança para um estilo mais civilizado que permita talvez aliviar algumas tensões políticas e militares existentes em diversos pontos do planeta. E não será pouco...