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terça-feira, fevereiro 24, 2009 

Névoa

Há momentos em que a liberdade de expressão e o conjunto de valores que vulgarmente designamos como "cidadania" parecem um enorme equívoco.
O mesmo vale para as noções de "bom senso" e de "mais elementar justiça".
Isto a propósito da condenação do empresário Domingos Névoa ao pagamento de cinco mil Euros por tentativa de corrupção activa do vereador José Sá Fernandes.
Não vou discutir o valor a atribuir ao crime de corromper ou tentar corromper um político em funções. Acho 5 mil Euros um absurdo encorajamento à corrupção, mas acaba por ser um absurdo menor, e quase "natural", no meio do aberrante absurdo da administração da Justiça portuguesa.
Mas faz confusão ao leigo a profundidade de raciocínio do Juíz.
Névoa tentou comprar Sá Fernandes com 200 mil Euros. Isto, ao que parece, ficou provado.
Este acto, merece ao Juíz, a classificação de "tentativa de corrupção".
Mas não se provou que os 200 mil Euros fossem para que o vereador "violasse os seus deveres".
Para que seria então?
Para violar deveres independentes da condição de vereador, como o de marido, por exemplo?
Mas será que a hipotética aceitação do suborno, mesmo que sem objectivo nenhum de especial, apenas e só porque Névoa "foi com a cara" de Fernandes, não violaria os deveres do vereador? Ou será que os 200 mil Euros, pelo contrário, serviriam para que Fernandes "cumprisse o seu dever"?
E sendo este o caso, não seria Névoa, afinal, a vítima de uma ignóbil tentativa de extorsão se não se tivesse dado o facto incompreensível de Fernandes o ter denunciado?
À luz do raciocínio do Juíz, acaba por ter de se dar razão a Névoa quando reclama que "não fez nada de mal".
E que vai recorrer.
E vai com certeza ganhar o recurso porque numa qualquer das instâncias superiores algum juíz vai mesmo encontrar o inevitável e clássico "erro processual".
Névoa até pode pegar nos 200 mil euros que poupou com o Sá Fernandes e dá-los a outra pessoa qualquer, quiçá, por acaso, a um juiz.
Desde que seja sem qualquer intenção de influenciar o resultado de qualquer julgamento, que fique já bem claro.