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sábado, novembro 11, 2006 

Coisas da vida

Alguns dos apoiantes da guerra do Iraque por idealismo, interrogam-se agora como foi possível ter-se chegado a esta situação caótica, na fronteira da selvajaria total.
Como foi possível que se tivesse avançado "sem um plano"?
Esquecer-se-ão por acaso que tudo decorreu conforme o planeado?
Todas as fases foram implementadas.
A invasão e acções subsequentes foram um mimo das potencialidades do pensamento ultraliberal ou neoconservador, o que se queira, aplicado à prática.
Quando até o exército americano foi em grande parte privatizado para quê falar do resto?
As objecções colocadas na altura a esse messianismo então de vento em popa foram varridas do mapa.
Quem detinha o poder irrestrito tinha pressa de aplicar um programa em gestação há décadas. O afã com que o exército de propagandistas voluntários ou a soldo que diariamente e durante anos tentou justificar as etapas deste desastre anunciado, faz espécie mas é um efeito menor, "sound bytes", para usar uma expressão que alguns deles apreciam.
Vão reler as preciosas peças da Economist, um dos órgãos de comunicação que durante muito tempo acompanhou de forma mais inteligente todas as fases do desenvolvimento do plano, sempre chamando a atenção para a importância de se cumprirem milestones como as palhaçadas das eleições, a constituição, essas cenas todas.
É claro que a Economist também junta a sua voz ao coro dos desiludidos do Plano, numa pecinha sobre o despedimento de Rumsfeld, aponta-lhe agora cobardemente os inúmeros "erros".
Como sempre acontece nestes casos, os preconceitos ideológicos tornaram surdas as pessoas.
Não perceberam, não queriam perceber, que não se tratava ( não se trata) de planos. Tratava-se de que o que se queria fazer e se fez foi mais uma das aberrações que o "Ocidente" praticou sobre povos do Terceiro Mundo, ou o que se lhes queira chamar.
O que se fez foi mais um exemplo da arrogância imperial do homem branco.
Foi a tal "atitude" que levou entre outras coisas ao 11 de Setembro, mas que de então para cá se tornou tabu mencionar.
Palavras como colonialismo, neocolonialismo, imperialismo foram varridas do mapa pela queda do muro e pela emergência sobretudo em África das cleptocracias sanguinolentas genuinamente locais que substituiram as cleptocracias coloniais também fundadas em episódios sanguinolentos mas mais digeríveis para o nosso palato sofisticadamente racista.
Mas os desiludidos do plano iraquiano, ou da sua inexistência, como preferirem, já que um plano lunático pode bem equivaler-se à sua ausência, que não desmoralizem.
Quando o Muro de Berlim caiu não foram poucos os que só então descobriram que o que se passava do lado de lá não era o paraíso que julgavam.
E o problema é este.
A nossa espécie parece ter dificuldade em encontrar soluções colectivas racionais que beneficiem a longo prazo o maior numero de pessoas, mas revela uma grande constância na tendência em que os grupos humanos têm em organizar-se quase automaticamente em slots ao longo de um espectro de opções ideológicas independentemente dos dados disponíveis para se compreender determinada situação.
Tanto no caso do muro, como do plano da pólvora para o iraque, uma grande percentagem de pessoas fixa-se numa opção e alguns até conseguem defendê-la brilhantemente, por maiores que sejam as evidências do seu erro.