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segunda-feira, julho 17, 2006 

Atrás de mim virá quem bom de mim fará

José Manuel Fernandes escreve hoje no Editorial do Público mais uma das suas análises brilhantes do conflito que envolve Israel (envolve é uma maneira de dizer).
(qualquer dia sai livro...)
O problema, diz ele, é que antigamente a militância palestiniana era laica, e sendo assim, havia alguma margem para negociações políticas.
Agora, constata-se que é uma oposição comandada pelo fundamentalismo religioso que apenas procura a destruição de Israel sem admitir qualquer espécie de negociação.
Está bem visto. Mas se é assim porque é que tanto Israel como os seus gigantones americanos tanto procuraram anos a fio minar essa resistência laica e favoreceram subtilmente o ascenso do fundamentalismo islâmico?
Porque é que Fernandes e outros "opinion makers" alinharam na brilhante ideia do Mossad de acabar com o Arafat como lider e interlocutor credível?
A palavra de ordem até era "não se negoceia com terroristas" não era?
Bush e a sua seita, se tal raciocínio não lhes estivesse vedado por definição, poderiam ter tido um vislumbre de inteligência e ter aproveitado o periodo de relativa calmaria que se seguiu à entrada em Bagdad, para pôr Israel um pouco na ordem, e conseguido manter um simulacro de "neutralidade".
Infelizmente, percebe-se agora, quando Bush "chamava" Sharon para conversas em Washington, não era para lhe "dar" na cabeça pelos abusos com mau aspecto que as suas tropas estavam a cometer ou para acabar com o muro da vergonha, era provavelmente para "levar" na cabeça até preceber que a Israel deveriam ser dadas mãos livres, incondicionalmente, para tratar do problema à sua maneira.
O resultado é que hoje, os Estados Unidos não têem qualquer influência no Médio Oriente, pelo menos como mediadores do que quer que seja, são temidos como cão de fila de Israel e nada mais.
É o resultado da estratégia da lei da força.
Mas como eles acham que têm sempre razão...

Caro Bidão Vil,
Efectivamente os Conquistadores de Almas é um blog meu, mas menos anónimo que o seu, creio.
Sobre as suas interessadas palavras, faria apenas dois comentários:
1 - em rigor, o meu problema não foi o ter falado demais, mas o ter ESCRITO demais. O busilis foi ter prestado as declarações por escrito, devido a circunstâncias descritas no próprio livro!
2 - Quanto ao processo de conversão ideológica, se deseja compreendê-lo melhor aconselho-lhe a leitura do "relatório Kubark", o manual da CIA para a tortura psicológica publicado internamente em 1963 e desclassificado em 1997. Verá que o meu caso quase parece um mero anexo exemplificativo do referido relatório. Estou por isso em crer que o meu caso foi muito mais vulgar do que se pensa, mas claro que ninguém o confessa, talvez nem a si próprio. Eu é que não tinha nada a perder, dado o que passei em 74/76...

Caro Velha Guarda, obrigado pelo comentário.
o facto de eu ter referido o "conquistadores" como "anónimo", deve-se ao facto de o nome do autor não aparecer em lado nenhum.
Ora poderia haver alguém que por uma qualquer razão, tivesse gostado do livro e resolvesse postar passagens dele, o que é comum na "blogosfera".
Não percebo pois, como se pode crer que o Conquistadores é "menos" anónimo do que o Bidão. Quando muito é "tanto", uma vez que apesar de no profile no topo esquerdo do meu template aparecer o meu nome próprio, este é, na realidade, tão anónimo e anódino como "Fred", "Alberto", "Pires de Lima" ou "Velha Guarda".
A não ser que se entenda o anonimato como "visibilidade" blogosférica ou outra. Se for essa a perspectiva, não discuto e dou de barato o maior anonimato do "bidão".
Resta esclarecer que usei o "anónimo" como uma informação que me pareceu objectiva, e não como uma classificação pejorativa. É que considero não haver discussão mais irrelevante, desinteressante e paroquial na blogosfera do que os supostos malefícios do anonimato.
Quanto ao que interessa:
Não sei se o grau de identificação com o "case study" da CIA foi tão generalizado como o descrito no livro, mas também não custa admitir que o grau de colaboração com a policia foi bastante mais vulgar e profundo do que é geralmente admitido. Suponho que na altura, o bom senso obrigaria a cautelas redobradas, que deveriam aliás começar, talvez, por evitar o tipo de promiscuidade legal/ilegal que é descrito e que levava à situação surrealista em que determinadas pessoas chegavam a "pensar" pertencerem a organizações quando na realidade não tinham esse estatuto.
Deve ser terrivel admiti-lo, e nesse aspecto o livro é um tour de force que se espera não venha a ter utilidade maior, uma vez que felizmente não se prevê para já o regresso às circunstâncias que o originaram, do que contribuir para o estudo de territórios da mente humana semelhantes aos explorados já há uns anos atrás no livro "a rapariga do tambor" de john le carré.
Reforço o outro aspecto que achei importante no livro que é uma rara tentativa de caracterização de uma época pouco discutida.

Caro Rui,
Verifico que o melindrei sobre a questão do anonimato e peço-lhe desculpa pelo facto, pois não era tinha essa intenção. De qualquer modo, julgo ser pacífico que qualquer pessoa me identificará como autor do referido blog, e como a minha ientificação é pública desde a publicação do livro... já relativamente a si, pelo contrário, não tenho elementos para saber se, por exemplo, é um meu antigo camarada, um colega actual, ou apenas um jovem bloguista a fazer o seu tirocínio político. Se isto não é anonimato...
Mas proponho que enterremos este assunto!
Claro que o conhecimento de como eram as coisas no tempo da PIDE pós-65 (isto é, desde que o Aljube foi fechado e que, estou em crer, a PIDE modernizou os seus métodos de tortura, instruída pelos estágios feitos na CIA) não terá, felizmente, interesse político prático imediato hoje em dia. E concordo em absoluto consigo que a história tem mais interesse no que revela dos mecanismos da alma humana, e que Le Carré é um grande professor dessas matérias.
Não li "a rapariga do tambor" e você acaba de me convencer a comprá-lo. Mas li "O espião perfeito" onde, por exemplo, identifico perfeitamente a relação entre a personagem e o pai como origem da sua propensão para criar dependências afectivas de quem quer que lhe prestasse atenção...
Note, entretanto, que também para mim passaram 33 anos desde os factos que narro, e que portanto eu e esse jovem de antanho já não somos a mesma pessoa.
Permita-me também que lhe diga que concordo absolutamente consigo sobre o porquê de não haver mais testemunhos daquela época. Acrescentaria apenas que, neste aspecto, pessoalmente me toca mais a falta de testemunhos sobre o que aconteceu em Angola em 74-75, do que sobre os nossos anos 70 cá. Refiro-me ao "poder popular" implantado em 74 muito por obra de m-l idos de cá, que depois foram trucidados pela facção Nito Alves /UEC, antes desta ser ela própria eliminada em 77. Muitos dos sobreviventes estão por cá agora e nenhum quer falar daqueles tempos de horror. E é pena...

Só mais uma nota:
Àcerca do seu comentário sobre quão doloroso me terá sido descer hoje à memória dos infernos, permito-me notar-lhe que de facto essa descida a tive de fazer em 1974-76, quando esperava o fusilamento pelo que me acontecera e fizera. Aliás, foi nessa altura que redigi as memórias em que se baseia o livro...
Para quem, na altura, foi acusado de muito mais do que aquilo de que realmente era culpado e por juízes que nunca passaram por prova análoga, publicar hoje as referidas memórias é apenas encerrar o luto de uma dor muito antiga.

Desconhecia completamente histórias de mls em Angola.
Já tinha ouvido umas referências esparsas em conversas de amigos mas tudo muito vago.
quanto à descida aos infernos:
Posso enganar-me mas todo o livro mostra sinais de ter sido reescrito ou "reavaliado", transparece nele, apesar de tudo uma certa distanciação emocional.
Posso enganar-me, o que me parece ser ausência de emoção poderá ter a ver com um estado de anastesiamento decorrente da perturbação, ou talvez tenha sido escrito com base nas notas de há trinta anos, mas a forma final modulada pela distância e por um outro olhar que não o do homem perturbado de há 33 anos.
Uma questão que se pode colocar e que até pode ter alguma importância na clarificação de todo o processo é:
se o essencial da "viagem" foi feito há 33 anos, o que determinou o "fim do luto" agora, ou melhor, só agora?

anestesiado, claro

Pensa bem, quando supõe que o texto foi modulado pela distância, ou seja, que foi "reavaliado" 30 anos depois.
Porquê só agora?
Precisamente por que só agora é possível esse distanciamento. Tanto da minha parte como autor, como da parte dos leitores.

Quanto à história dos m-l em Angola, o que me diz do seu desconhecimento total só confirma a minha nota sobre a falta completa de testemunhos e de historiografia sobre o assunto. É como com a militância m-l por cá nos anos 70.
Só que em Angola morreu imensa gente e a tragédia é exponenciada pela natureza do regime final que resultou daquilo tudo!...

Da parte dos leitores, a distância impõe dois aspectos contraditórios.
por um lado, permitirá esbater a crispação que a apresentação feita na capa do livro ("a descida ao submundo do maoismo", etc....) que pouco ou nada tem a ver com o conteúdo poderia criar entre alguns testemunhos da época, reavivando antagonismos pessoais, etc.
Por outro lado, essa "introdução", apesar de se inscrever numa lógica comercialóide de aproveitamento do fenómeno dos "códigos" e "códices" daQui e daLi, talvez seja revelador de um certo tipo de "leitura" possível ao leitor de hoje. Oxalá isso ajude as pessoas a comprá-lo e a reflectirem sobre o tema de fundo.
Quanto a Angola, e outros sítios, a monstruosidade do regime é um daqueles terríveis efeitos perversos da história mas é dificil pensar no que poderia ser feito à época para que tudo se passasse de forma diferente.
Talvez seja um pouco como cá, embora tenhamos sido ( talvez não totalmente por acaso) mais sorte: o 25 de Novembro parece ser uma indefensável "logicamente", mas tudo acabou por se passar da forma e no momento exacto antes de se entrar na tal espiral dos fuzilamentos e por aí fora.

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