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domingo, abril 10, 2011 

Cadeia alimentar

São inúmeros os documentários sobre cenas da vida na selva ilustrando episódios dramáticos entre predadores e membros de outras espécies que liquidam para sobreviverem.
Tudo integrado num processo contínuo e permanente de luta pela vida e preservação dos equilíbrios ecológicos.
A narrativa standardizada limita-se a definir como membros mais fracos das espécies que compõem a dieta dos grandes predadores num determinado momento, a constatação de que são os devorados. Un point c'est tout.
A cadeia alimentar.
O equilíbrio ecológico.
A vida na selva.
O que será natural quando decorre no anonimato da selva torna-se perverso quando o ubíquo voyeurismo do homem requer que os documentaristas assistam sem intervir a cenas da maior brutalidade para não perturbar a "pureza" e "naturalidade" do acto e o irresistível fascínio que o sangue e a violência têem para o consumidor televisivo, para quem trabalham.
Neste percurso, esquece-se que o que é "natural" no anonimato da selva, transmuda-se automaticamente em cumplicidade (uma cumplicidade qualquer) por mercê do testemunho intrusivo.
O que dizer porém quando o predador se encontra em cativeiro e depende do homem para se alimentar?
Que alibi moral podemos apresentar quando escolhemos a vítima com que alimentamos o predador?
Como fazemos a escolha da vítima se desconhecemos os critérios secretos com que elege as suas presas?
Onde o predador vê alimento mais ou menos propício, nós vemos um "objecto" com que satisfazemos não sabemos que instinto para mantermos o predador vivo na nossa posse. Esse desiderato basta-nos para perpretar um crime tranquilo.
Onde está a natureza?
Qual é o nosso papel na cadeia alimentar?