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terça-feira, novembro 01, 2011 

Sheik Mate

Kadhaffi encontrou o seu fim de uma forma degradante, abatido na rua.
Por um lado não pode deixar de se admirar a sua coragem e pertinácia. Por outro lado não pode deixar de se lamentar que esse encarniçamento tenha contribuido para a generalização e agudização da guerra civil.
Assassinado à queima roupa. Chocante.
Chocantes, também, as despudoradas congratulações de alguns dirigentes políticos ocidentais, não já pela queda, mas pela a morte de um homem que ainda há poucos meses abraçavam e recebiam nos seus países como líder respeitado e respeitável, apesar do seu estilo "colorido".
Degradantes as manifestações de euforia manifestadas nalguns media ocidentais, a que assistimos.
Parte desta euforia explica-se pelo alívio. Aparentemente chegou ao fim a responsabilidade de envolvimento  da Nato e alguns países europeus e os Estados Unidos, numa situação que se arrastava e ameaçava degenerar.
Nos States, a intervenção avalizada por Obama era pretexto para mais ataques dos neoconservadores. Nada de admirar, porque os neoconservadores não precisam de pretextos para atacar Obama (atacá-lo-iam, ainda mais ferozmente, se ele tivesse recusado intervir), mas não deixava de ser mais um espinho na vida difícil do actual Presidente.
Como é hábito, critica-se nos outros aquilo que nós fazemos. Os neoconservadores, que há quase uma década envolveram à força o mundo em duas guerras de onde parece ser impossível sair, criticam o Obama por ter avalizado uma intervenção claramente a prazo, pedida pela Liga Árabe, aprovada na ONU, decidida sem grande preparação específica, resolvida (com atraso em relação ao planeado) em seis meses, comprovando, de caminho, a teoria Rumsfeld: sem grandes alaridos internacionais, sem tropas (oficialmente, pelo menos) no terreno, apenas meios aéreos de combate e navais de apoio, "shock & awe" durante um período limitado e ops! ditador para a valeta.
O que acontecer a seguir "não lhe assiste". Não há pretensões de "nation building" para além do objectivo pragmático de repôr e manter infra-estruturas críticas a funcionar, nomeadamente as exportações de combustíveis fósseis. Com o tempo, cobrar aos líbios a ajuda...
Ninguém sabe o que virá a seguir.
Discute-se se o prolongamento da guerra mais do que o esperado, a proliferação de armas e a tradicional combatividade dos jihadistas líbios em diversas frentes de combate em todo o mundo, não provocaram a degenerescência da revolta contra um ditador em estado de guerra civil larvar. Mas a Líbia não é o Iraque nem o Afeganistão, pelo que não resta outra alternativa se não esperar.
Os opositores da guerra não estiveram muito melhor. 
O princípio da não intervenção nos assuntos internos de outros países é uma doutrina respeitável mas perde valor quando se torna capa de uma simpatia espúria por um ditador e manifestação de desconfiança em relação ao que virá, o que, claramente, viola o princípio. Foi algo deprimente assistir à indignação quase desesperada de alguns quando se tornou patente que Kadhaffi estava no fim da linha. Já não era uma revolta contra a queda de uma nação independente. Era luto carregado pelo Coronel.
É bom defender esse princípio, mas, para isso, colocamo-nos, em certos aspectos, ao nível da "real politik" cujas manifestações merecem frequentemente repulsa. Os tanques andam na rua a assassinar pessoas que se manifestam e nós, espectadores, "lamentamos", "indignamo-nos", lavamos a nossa boa consciência, mas não há nada a fazer, e no fundo, queremos que não aconteça nada.
Nesses casos, então, o melhor é mudar de canal. Para a "Casa dos Segredos".