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domingo, setembro 23, 2007 

Bravos Polacos

Perante o inexorável avanço do ateismo internacional, nem tudo está perdido para os ultra conservadores, existe um cantinho que resiste, qual aldeia gaulesa.
Terra de devotos e de Papas, última fronteira perante o Império do Mal.
Interessa meditar um pouco sobre isto porque talvez seja necessário usar um pouco de relativismo.
Voltando aos posts do José sobre a preponderância de gente da esquerda no panorama mediático dos últimos quarenta anos em Portugal, alguém se lembrou de pensar porque é assim?
E sendo em Portugal as coisas como são ( deixando de lado, aquilo que considero os exageros da opinião manifestada pelo José), custará muito reflectir sobre as razões pelas quais um número muito significativo de cidadãos dos países do Leste europeu reagem com alguma brusquidão quando um português inadvertidamente menciona a palavra socialismo?
Como é possível se aquela gente beneficiou durante quase cinquenta anos da protecção do manto benfazejo da "pátria do socialismo"?
Podemos arranjar todos os subterfúgios argumentativos que quisermos, agarrar-nos às explicações mais elaboradas mas, seja porque razão seja, aquela gente tem aversão à palavra "esquerda". E porquê? Intoxicados pela "propaganda ocidental"? Talvez, mas só se admitirmos que essa propaganda foi transmitida por veia intra venosa nos excelentes e gabados serviços de saúde universais e gratuitos prodigalizados pelo Estado nos defuntos países socialistas.
Na realidade, tirando umas emissoras fanhosas e meia dúzia de folhetos clandestinos, aquele pessoal estava provavelmente mais protegido da propaganda ocidental do que os portugueses antes do 25A, o que nos permitia, ainda assim, uma certa capacidade de escolha e em função disso escolhermos ser esquerdistas, enquanto eles vegetavam sem grande alternativa senão quererem ver-se livres de qualquer maneira do sistema em que viviam.
Que referências lhes restavam se a ideologia que em todo o mundo influenciou mudanças dramáticas nas relações de trabalho era a religião oficial dos estados em que viviam, o instrumento que servia para supervisionar o estado mais ou menos miserável das suas vidas?
Elocubrações sobre o "capitalismo de Estado tomado por dentro pela burocracia", o "social fascismo" ? Para quê, se ali à mão estavam a visão do paraíso proposta por uma igreja católica obrigada, para sobreviver, a cristalizar-se no tradicionalismo e a receita do antisemitismo mais brutal?
Talvez por isso tenhamos de ser um bocadinho indulgentes em relação aos polacos. Deixá-los assentar.
É que ainda por cima o estado actual da sociedade polaca parece bastante elucidativo acerca do que resulta da mistura gangrenosa entre moralismo rançoso, fanatismo religioso e "liberdade económica" .
Estamos mal habituados. Os nossos políticos de direita e a generalidade dos seus propagandistas incluindo muitos dos bloggers neocon são gente "fashion" e informada que nos divertem com interessantes teorias onde a realidade é substituída pela miragem do sucesso enquanto partilham connosco o gosto pelas novidades estéticas mais sofisticadas.
Quase que parecem apresentáveis.
Pelo seu lado a elite política polaca ostenta um conservadorismo saudável e genuíno em que as discussões estéticas andam à volta da forma de dizer a missa, e os dirigentes supremos apresentam o ar tranquilizador de grunhos abrutalhados, gente séria, honesta e trabalhadora do tipo pão pão queijo queijo que é o arquétipo do "povo" para todo o reaccionário preocupado com quem tente "mandar nele".
Com a gente certa no poder nenhum conservador português se lembraria de chamar "asfixiante" à situação na Polónia e todas as tropelias cometidas nos últimos tempos pelo Governo, passíveis de explicação lógica e "serena".
Até na economia, em que um PIB em crescimento acelerado convive com astronómicas taxas de desemprego a Polónia é interessante de observar para que se perceba o que vale avaliar estes indicadores separadamente.
Por outro lado há que reconhecer à Polónia o mérito de saber "bater o pé".
Eles podem ser os únicos a pensarem uma determinada coisa, mas não abdicam em questões humanistas e de princípios de indefectível defesa do valor supremo da vida como tentativas espúrias de posições colectivas contra a pena de morte.
Para todos os que se insurgem contra a "burocracia" de Bruxelas é algo de muito animador.