terça-feira, abril 28, 2009 

Doença infantil

Graças ao Rogério da Costa Pereira, tive os meus cinco segundos de fama, o que se reflectiu nas visitas ao Bidão.
Acho que bateu o record diário.
O Rogério, a quem daqui devolvo o abraço, teve a simpatia de recuperar um comentário que eu fiz a um post dele sobre os últimos desenvolvimentos da chicana política e promoveu-o a post no Jugular.
Os comentários que fiz situam-se na linha do que escrevi ontem aqui sobre o absurdo de um Primeiro Ministro estar desde há meses refém de uma campanha nojenta, e simultâneamente ser alvo de um processo por ter emitido uma opinião negativa sobre a qualidade do trabalho de um órgão de comunicação.
Em muitas crónicas e comentários nota-se uma convicção quase infantil de que o Primeiro Ministro, por ter sido eleito em eleições livres, e neste caso particular com maioria absoluta, deixou de ter direitos como cidadão e deve permanecer encurralado a um canto perante todo o tipo de ataques.
Qualquer um tem o direito de exprimir da forma como quiser o seu desagrado pelas políticas do Governo. Embora alguns defendam mais "respeitinho", defendo o direito de pessoalizar as críticas e fazê-lo de forma agressiva por palavras e por vezes, também, porque não, por actos. Está nesta linha, por exemplo, a observação rasca do "Xico Esperto"que Marcelo Rebelo de Sousa fez há uns tempos num programa de televisão.
Ora, tanto quanto eu saiba, o Primeiro Ministro não processou ninguém por injúria ou delito de opinião.
O que me parece absurdo é que quem formula acusações concretas gravíssimas sobre o PM, e exige que ele "clarifique" os factos de que é acusado, se admire depois que a forma mais clara dele "clarificar" essas acusações é, precisamente, processar por calúnia quem as faz.
Nem outra coisa esperariam certamente todas as pessoas governadas pelo Primeiro Ministro e é sintomático que um dos sujeitos com quem esgrimi argumentos no Jugular tenha perguntado, "porque é que ele não processou o Charles Smith?". Primeiro desafiam-no a "processar" por calúnia, depois criticam-no por processar sendo Primeiro Ministro, porque, acrescentou o tal sujeito, "não está na Constituição que o papel do Primeiro Ministro seja "processar"" e o que realmente ele devia fazer era demitir-se. A atitude é tão infantil que dói.
É bom notar que tudo isto se passa no contexto de um processo que se encontra ao abrigo do chamado "segredo de justiça" e o segredo de justiça, já sabemos, é o pretexto para calar alguns enquanto outros podem ir doseando a informação de forma a manter um clima prolongado de desgaste.
Nunca é demais lembrar o caso Casa Pia e a forma como Ferro Rodrigues foi continuamente enxovalhado até ser posto fora do tabuleiro.
Lembremo-nos também de que o caso Freeport tem anos e que a fase actual da libertação de informação a conta-gotas já dura há vários meses.
Alguns ingénuos, no grupo dos quais me incluo, têm guardado alguma distância sobre o caso, evitando deixar-se envolver pela balbúrdia pseudo informativa esperando que se terminem as investigações e se faça um julgamento. É pois com alguma surpresa que se constata que o julgamento já foi feito, na praça pública, o que justifica a arrogância com que uma misturada de alarves semi analfabetos e oportunistas políticos com cabeças de cartaz do tipo da inenarrável Manuela Moura Guedes falam do caso.
Uns porque não toleram um partido de esquerda no Governo, outros porque fazem umas contas de aritmética de merceeiro com os resultados de sondagens e julgam que uma hipotética queda de Sócrates lhes vai trazer a tão ansiada Revolução.
Vi há minutos o final do Eixo do Mal e deprimiu-me constatar que o mais entusiasta (o único?)defensor da "normalidade" de tudo isto era o ... Daniel Oliveira. Dizia ele que nos outros países da Europa (não sei se se trata da "europa neoliberal" ou outra), tudo isto é "normal", o resto é "vitimização" do Primeiro Ministro... Dói.

 

Depois de nós

Qual o significado destas estruturas abandonadas na paisagem como totems de um culto esquecido?

domingo, abril 26, 2009 

Perplexidade

É dado adquirido em democracia que um responsável político pode ser achincalhado em praça pública em nome da liberdade de expressão, opinião e informação.
É normal e até saudável num regime democrático.
Alguns extrapolaram daqui a noção de que esse responsável político pode ser impunemente repetidamente caluniado.
Não se trata já de dizer que "Sócrates é um bandido que traiu o povo", ou sequer de saber se fez ou não um bom negócio quando comprou a casa. Trata-se de escarrapachar por tudo quanto é sítio que "Sócrates recebeu x milhões de euros para aceitar um relatório que viabilizou a aprovação do Freeport".
Sócrates, e muito bem, evitou o alarido público que esperavam os que lhe pediam capciosamente "explicações" e fez o que minimamente lhe era exigido, processando judicialmente quem considera que o caluniou.
Para os "extrapoladores", porém, Sócrates deve ouvir e calar, isto é, aguardar que se terminem as investigações do caso Freeport, que se encontra num estádio conveniente ironica e hipocritamente designado como de "segredo de justiça".
Mais, segundo luminárias do calibre de Vasco Pulido Valente, Sócrates nem sequer pode reagir enquanto for Primeiro Ministro. Alguns, vão mesmo ao ponto de defender que se Sócrates "fosse sério", deveria demitir-se primeiro e depois ir para os tribunais. Esta última proposta daria uma boa estratégia política. Para desmontar um Primeiro Ministro com maioria absoluta basta chamar-lhe "filho de uma grande puta" no jornal, e se não bastar, informar que "esse sacana falsificou a minha assinatura e roubou as minhas poupanças". Das duas uma, ou o homem se demite, ou, não o fazendo, prova inequivocamente que "não é sério", ou não tem fibra para ser, precisamente, Primeiro Ministro.
Se estas interpretações da liberdade de expressão (não podemos em verdade classificá-las como "liberdade de informação" a menos que estejamos dispostos a considerar o Gato Fedorento como um programa de informação) podem ser questionáveis, onde este recente ataque ao Primeiro Ministro me deixa perplexo é quando evolui para uma inversão dos conceitos de liberdade.
Depois de ser avacalhado da forma mais acintosa durante meia hora por uma figurinha grotesca num programa de pretensa informação, Sócrates é processado pela figurinha e pelo marido desta que por acaso é o director da estação onde ela trabalha, por, numa entrevista a outro canal, emitir uma opinião desvaforável sobre o conteúdo informativo da emissão em que foi atacado .
Não se trata já de um Primeiro Ministro de quem muita gente não gosta não ter direito a emitir uma opinião. Trata-se de um sujeito qualquer, PM ou não, poder ser processado por emitir opinião desfavorável sobre um órgão de comunicação.
Quais são as consequências disto para a liberdade de opinião? Alguém pensa nisto? Fico pois perplexo quando leio este tipo de coisas.

sábado, abril 25, 2009 

Falem do Maddoff

Perguntei a quanto é que os gajos do restaurante compram a garrafa de vinho.
- A um Euro, respondeu-me.
- E por quanto a vendem?
- Dez Euros.
Imaginei aqueles cidadãos conscientes "que pagam impostos", degustando a pequena maravilha pelos módicos 10 Euritos e proferindo indignados discursos contra a chulice do Estado.

 

Missão impossível

Santana Lopes tem muitas probabilidades de ganhar de novo as eleições para a Câmara de Lisboa. A não ser que a esquerda faça um pleno, o que é pouco provável.
De realçar, de um lado o pragmatismo: o PP e o PSD não têm problemas em coligar-se quando as probabilidades reais de vencer existem. Manuela Ferreira Leite, a representante do "PSD sério", não teve pejo em nomear como candidato o indivíduo que pouco tempo antes personificara todos os defeitos do "PSD populista" por lhe parecer que será o personagem com maiores probabilidades de vitória. Do outro lado, da esquerda, ninguém se entende com ninguém. Muitos tratam Santana como um monstro de sete cabeças, mas na hora de estabelecer compromissos preferem manter as distâncias e a "independência" dos seus aliados naturais não se importando de eleger o "monstro" para não cederem nos "princípios", eufemismo útil para questões de ego.
Existe on line uma petição bem intencionada apelando à convergência da esquerda nas eleições para a Câmara de Lisboa.
Aposto que todos os principais protagonistas vão analisar "com muita atenção" o sinal que isto envia às diversas direcções partidárias.
Como todas as boas intenções suspeito que vai cair em saco roto.

 

Recados, recadinhos

Cavaco fez um discurso civilizado. Falou do óbvio. Criticou de forma subtil a questão dos grandes investimentos públicos.
Logo após o aguardadíssimo discurso, os jornalistas e comentadores precipitaram-se a identificar os "recados" ao governo, a nova figura de estilo que caracteriza o tom essencialmente futeboleiro e coscuvilheiro com que a "imprensa moderna" acompanha o confronto político.
Quanto a mim, a crítica mais directa de Cavaco foi à oposição. Discutam o essencial, as questões políticas que interessam a quem sente a crise a entrar-lhe em casa no dia a dia.

 

Liberdade, igualdade

O facto de Paulo Rangel não ser obrigado a alinhar no consenso geral de relativa détente, já que os discursos dos restantes partidos da oposição foram o que se pode considerar "normais", não tornava obrigatório que fizesse o discurso mais parvo da manhã.
A coisa pretendia-se épica, destinada a "fazer história".
Infelizmente o que não seria mais do que um discurso eleitoralista e relesmente demagógico de ataque ao governo, descambou para a pimbalhada do "carne da nossa carne, sangue do nosso sangue...".
Salvou-o um detalhe: na sentida, embora tresmalhada, exaltação à Liberdade que fez, é de assinalar o facto de ter relacionado o exercício pleno da Liberdade à reunião de um mínimo de condições económicas sem as quais esse exercício não passa de uma formalidade hipócrita. Somando isto às preocupações que o PSD passou nos útimos meses a manifestar contra os projectados investimentos do Governo, uma pessoa é levada a pensar que, sabe-se lá vinda de onde, esse partido ganhou uma certa patine "esquerdista obstrucionista".

 

25 de Abril, Sempre

Carlota segue atentamente os discursos.

segunda-feira, abril 13, 2009 

Normalização

Ao ler as crónicas dos "especialistas em questões militares", dos teóricos das Relações Internacionais e peritos em geoestratégia, percebe-se um outro significado da eleição de Obama.
Há uns anos atrás eram os neocons histéricos por intervir a todo o custo e em todo o lado que agressivamente vituperavam quem alertava para o disparate que se preparava.
Agora, são as mentes mais ponderadas que se enebriam com a "missão", sempre com o persistente zumbido militarista dos neo-conservadores como pano de fundo.
Perante os sinais de diálogo do novo presidente americano, a Europa não pode "ficar para trás", é o novo consenso.
Afastado o "mau da fita", é tempo de o Ocidente se envolver novamente, de boa vontade e a tempo inteiro, nos atoleiros do Iraque e do Afeganistão.
Seja como caricatura como diz a frase feita, seja como tragédia, o que é certo é que a história parece repetir-se.

 

Distracção

O quê? A capa do Público de hoje não traz uma manchete qualquer sobre o caso Freeport?

sábado, abril 11, 2009 

Problema de Corno

Temos andado tão fascinados com a panóplia de mecanismos de vigilância global popularizados por Holywood, que esta história dos piratas somalis parece completamente inverosímil.
Depois de uma perseguição de algumas horas, o navio americano Alabama tornou-se no primeiro navio da história da marinha americana a ser ocupado por piratas. Um facto histórico, portanto.
Pelas águas da região passam anualmente cerca de 25.000 navios, o que dá uma média de 69 navios por dia a proteger por cerca de 30 navios de guerra de vários países já presentes na região.
Onde estão os Apache? Onde estão os Stealth? Onde estão os sofisticados sistemas de detecção e comunicação presentes em todos os navios de guerra dos países mais avançados? Onde estão os sistemas de satélite da seita Ciosa do John Voigt, capazes de fazer a vida negra ao infeliz Will Smith no Inimigo Público?
Isto quanto ao problema logístico. Quanto ao problema político é toda uma outra história (ler os comentários de halgeel84 ao artigo do Guardian linkado acima para abrir o leque de enquadramentos possível).
Sinal dos tempos, a fraseologia libertária que inspirou em tempos a outros piratas designações do tipo "Exército Popular de Libertação de Qualquer-Coisa" não parece já ter o mesmo apelo. O grupo de piratas fotografado por Veronique de Viguerie para o Guardian chama-se simplesmente a Central Regional Coast Guard... é mais honesto e mais pragmático.

 

The return of the son of "A teu a seu dono"

Diga-se de passagem que esta questão do ateísmo deveria ser encarada de uma forma natural e sem proselitismos. O ateísmo é apenas uma visão do mundo que decorre da constatação de determinados factos relativos à natureza do universo e da vida, a natureza da "natureza", nada tem a ver com hipotéticas superioridades morais ou intelectuais dos ateus.

Capítulo obscurantismo, tal como se passa a vida a falar da Inquisição e a argumentar que as religiões são um factor de desestabilização, também houve milhões de mortos causados por regimes que se reclamaram do ateísmo.

É fácil criticar as recentes posições do Papa sobre o preservativo e a Sida, mas quem o faz numa perspectiva de minimização moral da Igreja esquece-se de que o ateísmo serviu a alguns de justificação para a intervenção no Iraque (contra o "obscurantismo", embora de forma selectiva) e fundamenta a investigação científica em áreas potencialmente catastróficas para a espécie humana.

O proselitismo ateu arrisca-se a fazer passar o ateísmo por aquilo que de todo não é: uma espécie de religião alternativa.

Assumindo-me como ateu desde a adolescência e nunca tendo tido qualquer problema em manifestá-lo, vivendo num país considerado católico mas onde a influência real da Igreja é reduzida no que respeita aos costumes, e mesmo quando é forte relativamente a determinado tema, não dispõe ( e não dá indícios claros de que pretende obtê-los) de mais meios de coacção sobre a população do que qualquer outro grupo de interesses que se manifeste na sociedade, sendo que em muitos casos até se manifesta de forma mais pacífica do que outros, deixam-me um bocado perplexo aqueles ateus que parecem viver sob uma opressão terrível e permanente por parte da Igreja Católica, a que se referem usando o acrónimo depreciativo ICAR (Igreja Católica Apostólica Romana).

Digo isto por me parecer da mais elementar justiça, não é por desejar ou achar frutuoso algum "diálogo" sobre o tema, independentemente do respeito que tenho pela forma como muitos dos meus amigos e amigas vivem a sua religião.
Se por diálogo se entende a possibilidade de pessoas com convicções diferentes encontrarem plataformas comuns de relacionamento relativamente à esmagadora maioria das grandes questões, sou pelo diálogo.
É também disso que se trata quando se houve falar em diálogo entre ciência e religião. Quanto a mim não existe diálogo possível entre estes domínios.
Que Daniel C. Dennett ( particularmente em Breaking the Spell) e outros tentem explicar o aparecimento da religião como fenómeno "natural", explicável à luz das leis da evolução, é uma coisa. Que esse projecto claramente anti-religioso seja apresentado como uma tentativa de diálogo racional entre ciência e religião é outra completamente diferente que escamoteia o facto essencial: Dennett é ateu e visa desmontar ( ao "explicá-lo" racionalmente) o edifício religioso.
Se por um lado é compreensível a preocupação da Igreja moderna que se pretende livre de crendices em estar actualizada relativamente aos avanços da ciência de forma a integrá-los na sua visão do mundo, não se compreende como pode haver da parte dos cientistas enquanto cientistas qualquer "compreensão" relativamente a fenómenos como a Fé, afinal o âmago da experiência religiosa.

 

A teu a seu dono

No meu perfil do Facebook escrevi que sou ateu. Como a palavra aparece depois sublinhada clikei-lhe (cliquei-lhe?) para ver se era algum link que permitisse explorar eventuais grupos de prosélitos ateus do Facebook. Em vez disso deu para verificar que "Ateu" é um nome próprio muito usado por homens e mulheres da Indonésia a Marrocos e aparece em nomes tipicamente brasileiros como Ateu de Jesus e outras variações.
É mais uma acha para as guerras religiosas a dar razão àqueles que defendem que o ateísmo está em recessão. Afinal Ateus são nomes próprios, ateus ateus são uma minoria.