terça-feira, janeiro 15, 2008 

De um trago

Sim, foi na Ponta da Ilha.
Na voz da menina de rosto resplandecente o nome do sítio sugeria mistérios e encantos prodigiosos, o que me levou a aceitar acompanhar o meu Pai naquela viagem de trabalho.
Talvez na esperança secreta de ver a menina.
Talvez o querer estar nos sítios por onde ela passava.
O meu Pai chamou-me para dentro do edifício.
No átrio, ele próprio e mais dois homens, o cabo do mar e outro, certamente o faroleiro, esperavam-me com um ar cerimonioso.
Em cima de uma pequena mesa, pousados sobre um naperon branco, uma garrafa e um belo cálice meio cheio de um líquido com um tom entre o âmbar e o siena.
Indescritível, será mais apropriado.
A porta ficou aberta.
O meu Pai disse-me :
"angelika, bebe".
Foi rápido. Levei o cálice meio cheio do líquido precioso e dulcíssimo à boca e com a minha subtileza habitual emborquei-o de um trago.
Quando pousei o copo, gerou-se um silêncio constrangido.
Um brilho divertido nos olhos do meu Pai, traíu o tom entre o reprovador e o perplexo com que se me dirigiu:
Bebeste-a toda.


 

Voar no deserto

Ao assistir a certas discussões públicas como a de ontem no Prós e Contras da RTP1 sobre o novo aeroporto, fico com inveja da facilidade e convicção com que as pessoas identificam os seus interesses como sendo os únicos interesses legítimos.
Desta vez parecem mais "interesseiros" os autarcas e os industriais do Oeste, como Henrique Neto, porque estão na mó de baixo.
Se os autarcas são um pouco mais básicos, impressiona ouvir a argumentação incompreensível de Henrique Neto.
Lapalissiano: é tudo uma questão de "interesses". Mas eis que faz a sua entrada subreptícia a luta de classes. Alcochete são os interesses das grandes famílias ligadas ao turismo na costa do Alentejo...
Interesses aparentemente menos legítimos, mais obscuros.
Já a Ota, seriam os interesses das pequenas médias empresas do Centro e do Oeste, o povo em festa.
Será que o interesses destas não é transformarem-se elas próprias em grandes empresas, grandes famílias, grandes interesses?
E depois o problema, que não se resume à discussão do aeroporto, do "igualitarismo vertical".
Não se trata já de tentar promover uma igualdade de oportunidades, ou mesmo de fazer um esforço discriminatório para impor uma certa dispersão excessiva dos rendimentos dos cidadãos.
Não, trata-se de ter "os mesmos direitos" no sentido de toda a gente, ter o direito a tudo.
Se a escolha do aeroporto tivesse beneficiado a Ota, a região Oeste não se sentiria lesada, e muito menos obrigada a compensar minimamente as regiões a quem não coubesse em sorte um aeroporto.
Seria uma consequência "natural" de uma boa posição geográfica, olha que sorte...
Porém, como afinal o aeroporto foi para outro lado, o Oeste já tem de ser ressarcido, compensado desta desfeita. Correu riscos, apostou, e... perdeu.
Mas os adeptos do "gosto do risco", é sabido que não gostam de sair prejudicados. Quando ganham são homens de visão que tudo devem apenas à sua capacidade, ao seu talento... é ler aí nas livrarias a empilharem-se as historietas dos "gurus" da gestão.
Quando perdem? Em Portugal, pelo menos, exigem indemnizações, compensações.
Resta-nos esperar pelas aberrações de obras públicas que o governo vai ter de autorizar e aprovar para acalmar o despeito dos autarcas intérpretes dos "legitimos anseios" de tão laboriosa região...
Numa coisa talvez Henrique Neto tenha razão e Augusto Mateus me pareça demasiado displicente.
Como é que se vai impedir que "o deserto" se torne numa colmeia de betão à volta de um tão forte polo de emprego?
É o que vamos ver nos próximos anos. Para já, limitamo-nos a seguir a evolução do preço por metro quadrado numa zona onde, tirando o aeroporto não se vai permitir, dizem, a "especulação imobiliária"...

 

Pág. 4

Angels & Devils, pág. 4
S.Clay Wilson, 1972, Zap Comix n.º 6

segunda-feira, janeiro 14, 2008 

Hipócrites

Ao almoço, a minha irmã informa-me de que não é obrigada a tratar ninguém que apareça no hospital sem estar de algum modo identificado.
"Porquê?", pergunta a família.
"Pode ser um criminoso..."
Então e o famoso juramento de Hipócrates? Não é válido para qualquer vida?
Parece que não. É o juramento de Hipócrites.

 

Sintomas

Tirando as histerias dos reaccionários, já é altura de reagir contra:
- a lei que pretende encurralar e extinguir os pequenos partidos. Acabar com os pequenos partidos, qualquer que seja a sua cor política, não é de todo aceitável numa sociedade livre. O resto é conversa da treta.
- os fundamentalistas das estradas que se preparam para obrigar os automóveis a circular à velocidade dos pedestres. Por enquanto só exigem nada mais nada menos do que 30 quilómetros à hora... mas não tardarão a pedir mais, isto é, menos...

domingo, janeiro 13, 2008 

O desaparecido

José Martins Garcia está clandestino nas livrarias.
Na FNAC desconhecem, na Bertrand aparece a referência de um livro da editora Salamandra, na Byblos nem aparece nos catálogos.
Hoje lá encontrei dois livros na Ler Devagar:
Contrabando Original e
Memórias da Terra.
Ambos da colecção Chão da Palavra da Vega ( o site da APEL, aponta para o endereço de uma Vega que é uma agência de turismo...).

 

O fássismo a sério

É precisa uma certa dose de lata.
Afinal, tanta ironia sobre o fássismo, e agora é que parece que ele chegou. Em força.
Aquilo dantes não era nada, era conservadorismo autoritário, tudo o que se queira, mas não era a coisa a sério, agora é que sim, o fascismo.
O que é bizarro é que nos aproximamos afinal da distopia de um País ordeiro, civilizado, nórdico, helvético ou saxónico, onde as leis "são para cumprir", pela qual alguns persistentes arautos andaram anos a carpir.
Infelizmente tiveram azar: em vez do iluminado que destrói o estado "em seis meses" enviando para o desemprego milhares de pessoas de uma penada, o que seria um grande acto patriótico e democrático, chegou o funcionário que atende à reinvindicação antiga de fazer cumprir a lei.
Eu também acho irritante a nova Lei do Tabaco, mas...
Será que a lei do tabaco só é aplicada em Portugal?
Será que só é aplicada na Europa?
Será que só é aplicada em países com governos socialistas?
Seriam visões as imagens com quase vinte anos de grupos de empregados americanos a fumarem em cubículos por força não dos ditames do racionalismo económico do Estado Providência "controlador da vida das pessoas" mas dos ditames do racionalismo económico ainda mais impiedoso das companhias de seguros privadas?
Claro que todas as leis "são para se cumprir", mas, curiosamente alguns descobrem agora que "depende da forma como são interpretadas".
O costume.
Tudo muito rigoroso desde que lhes não caia na rifa. Nesse caso reclamam mais "civilização". Quando lhes cai na rifa? Aqui d'El - Rei que vem o fascismo!
Parece-me que a crónica de hoje do Rui Tavares no Público encerra este assunto da nova vaga de temas "fracturantes" da direita.
Talvez isto mostre finalmente às pessoas que a nossa bandalheira, a nossa relativa ineficiência É UM BEM precioso, é afinal a nossa versão dos famosos "checks and balances" com que passam a vida a moer-nos a cabeça.

sexta-feira, janeiro 11, 2008 

Curto circuitos

José Miguel Júdice tem a amabilidade de nos informar no Público que o Primeiro Ministro teve a amabilidade de o esclarecer pessoalmente da falsidade de uma notícia do impoluto Correio da Manhã que inspirou uma sua crónica. Ainda a história ridícula dos nomes de santos nas escolas.
A amabilidade de Júdice tem duas vantagens:
Em primeiro lugar elucida-nos sobre a credibilidade das suas fontes de inspiração.
A leitura de um jornal.
E para desmentir o que escreveu, não é necessária qualquer investigação, por básica que seja, como ler os documentos que lhe deram origem. Basta a garantia de um político.
Em segundo lugar traz alívio ao Director do Público.
Inúteis as tortuosas consultas a "fontes em Bruxelas" de credibilidade duvidosa sobre as decisões do Governo, basta pedir, através do seu cronista, um esclarecimento amável ao Primeiro Ministro.

 

Uf!

Finalmente libertadas as duas prisioneiras das FARC.
Faltam Ingrid Betancourt e os restantes reféns inocentes.

 

Grandes decisões (slight return)

Num telejornal da SIC, a notícia de que Bruxelas pede ao Governo português a decisão DEFINITIVA sobre Alcochete.
Será que sob a pressão da CEE, um organismo do estado português vai finalmente tomar uma decisão clara e sem ambiguidades sobre uma questão polémica e difícil ?

 

Mais decisões

Bush decidiu promover o Processo de Paz no Médio Oriente.
Em boa hora, perto da saída, para permitir aos asseclas fixá-lo na história como um grande homem de estado. Amante da Paz.
Talvez que o Prémio Nobel da Paz até que não ficasse mal, preste-se o Habbas a uma farsa qualquer.
Pelo menos calaria a boca aos críticos da iniciativa de paz em curso no Iraque desde há uns poucos de anos.
Não faltarão historiadores e cronistas ansiosos por elaborarem sobre o tema.
Para ser justo e equilibrado, Bush pede que Israel pare com os colonatos ilegais.
Um pequeno equívoco.
Israel, qualquer dos sionistas da nossa praça nos pode explicar com calma, não tem colonatos em lado nenhum.
E os que tem, muito menos são ilegais. Por definição.
Ok. Já que é o Bush que pede, é capaz de se arranjar um para a fotografia, como gesto de boa vontade. Vão lá uns soldados e transportam meia dúzia de desgraçados ao colo com grande estardalhaço.
A bola fica do outro lado.
O Irão que se desarme, o Hezbollah que desapareça, a Síria que renuncie aos territórios ocupados, os palestinianos que se resignem ao Muro e à miséria.
Esta é a mais fácil.

 

Grandes decisões

Governo decidiu stop novo aeroporto em Alcochete stop nem tudo perdido stop decisão apenas preliminar stop entregar estudo Covilhã para a semana stop

terça-feira, janeiro 08, 2008 

Baralhado do clima

Tal qual o tempo quente, a silly season teima em prolongar-se.
Frutos exóticos como o editorial de hoje de José Manuel Fernandes (1), caem de podres. A baralhação total.
Fernandes merece elogio por querer fazer honestamente o seu trabalho que é bater no Sócrates enquanto engraxa metodicamente o Cavaco, mas tendo lá a trabalhar uma plêiade de colaboradores de luxo mais competentes, porque se não se concentra nas ingénuas redacções sobre as suas leituras de interessantes livrecos de propaganda conservadora?

O Primeiro Ministro aprestar-se a convocar um Referendo para a ratificação do Tratado de Lisboa sem dar cavaco ao carismático jornalista! Reconheça-se a desfaçatez, valha Deus...

Mas tem-se batido tanto no Governo por causa da previsível (até hoje) intenção de ratificar sem Referendo, que se suporia que os críticos rejubilariam por esta manifestação de apreço pela opinião do pagode.
Mas ao Fernandes ninguém engana, especialmente um primeiro ministro que lhe não passa cartuxo. O hipotético reconhecimento de uma reinvindicação supostamente popular não interessa, o que interessa é a personalidade de quem reconhece.
Faz lembrar um antigo panfleto:
"quando um oportunista propõe uma acção correcta, não devemos aceitar o que o oportunista propõe, como positivo, temos de analisar a proposta à luz dos princípios e da estratégia do oportunista e desmascará-lo".
José Manuel Fernandes ainda tem, felizmente, estes princípios bem presentes, sinal de boa memória e saúde.
Quase no fim do delírio, um último fôlego transporta o autor para um patamar superior do ridículo.
Depois de tanta retórica sobre a possibilidade de ser convocado o Referendo, com base em "informações que o Público recolheu ontem, em Bruxelas...", o jornalista desmarca-se nos últimos parágrafos, protege a retaguarda, não vá o diabo tecê-las e as fontes estarem enganadas. E sai isto:
"Mas podíamos não estar a discutir nada se, com clareza e frontalidade, José Sócrates tivesse aberto o jogo quando devia, tal como fizeram quase todos os líderes europeus. Não fez, e assim especulamos sobre o que terá decidido. E até pode ser que nos enganemos, que Sócrates não anuncie o referendo, se bem que há muito o devesse ter dito...."
Quer dizer: ele NÃO SABE o que, e se, decidiu ou não o Sócrates, mas faz uma crónica baseada numa hipótese de decisão ( a hipótese errada, ao que tudo indica...). Mas, pelo sim pelo não, avisa desde já que até pode estar enganado...
Acabo por quase lhe dar razão: podemos, de facto, não estar a discutir nada...melhor, não estamos a discutir nada, é rigorosamente só fumaça.

(1) Parece que é problema pessoal meu com o josé manuel fernandes esta insistência recente em referi-lo nos meus posts. Nada disso, o que acontece é que ando diariamente cerca de 40 minutos a pé até ao trabalho e o Público é o meu entretém.
Há muita coisa interessante no jornal, por exemplo, a brilhante carta do leitor José António Pinto, um texto que orgulharia qualquer jornalista com opinião e minimamente decente, publicada logo abaixo do editorial do JMF. Mas com o barulho do trânsito é sabido como acabamos por dar atenção às coisas mais estúpidas. É a natureza humana.

 

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Angels & Devils, pág. 3
S.Clay Wilson, 1972, Zap Comix n.º 6

domingo, janeiro 06, 2008 

Adeus obscuro ao gigante maldito

Foi há muitos anos, é assim que estas histórias começam para acabar sempre.

Depois de uma viagem mágica por território que os mapas insistem em situar nas Beiras mas que na memória ainda contaminada pelas brumas daquele amanhecer na cidade mais alta se incrusta em obscuro reino psicadélico só palidamente vislumbrado em certos cenários Tolkianos, aportámos a uma terreola discreta com o singular nome de Régua, na margem de um rio caudaloso.
Régua, nome de rigor.
Uma semana rigorosamente inesquecível de aventuras pontuadas pelas obrigatórias paragens no Stop para recarga alcoólica. O Stop, era para parar.
De rigueur.
Descidas em ponto morto desde Vila Real na escuridão das altas horas , gestão optimizada das trajectórias a exigir o recurso à contramão como método standard de condução, faróis desligados para mais fácil detecção de objectos indesejados em sentido contrário na via, visitas à choça após intervenções criativas em sinais de trânsito, os paliativos de uma época negra mas que paradoxalmente fizemos sem regras.
Demarcámos um pequeno, fugaz e efémero território. Lobos.

Dobrado no bolso, no lugar "d'O Livro", "O libertino passeia por Braga a idolátrica, o seu esplendor", um pasquim impresso em conspícuo azul sobre papel pardo que ainda não sei como ali foi parar nem que rasto seguiu depois.
De onde tinha saído aquele gajo? Que escrita era aquela que rompia com toda a moleza pestilencial que nos impingiam como literatura e modelo de conduta?
Tentei depois seguir aqui e ali as obras desse autor, Figura tornada mítica.
As literárias e as outras. Confundiam-se, aliás.
O mito era relapso às historietas passíveis de equívocos glamorosos. Era rigoroso o relato de vivências marginais e nessas vivências, íntimas, dolorosas, não cabiam figuras de pacotilha saídas de anúncios de jeans.
Num breve período de boémia no Bairro Alto, lembro-me de o ver chegar ao Expresso Bar. Sobretudo cinzento puído, óculos de fundo de garrafa, ar prazenteiro, dedo indicador em riste imediatamente dirigido ao decote da rapariga que estava à porta.
A chegada causou escândalo e estupor. Parece que um tal Cabeça de Vaca, infelizmente também já desaparecido, passara as semanas anteriores a fazer um peditório entre os boémios, "para o Luiz que estava no hospital às portas da morte"...
Luiz seguiu depois as suas aventuras e desventuras. Até ontem.

 

Como tudo pode acontecer

No editorial do Público de Sábado 5 de Janeiro, a propósito das eleições americanas e dos candidatos Obama e McCain, aconteceu a seguinte passagem:

"... Uma mudança no estilo da política fraccionista e sectária que tem marcado Washington desde o início dos anos 1990".

A duplicidade é evidente: o período referido inclui a administração Clinton, o que esbate a verdadeira catástrofe que foram ( têm sido) os anos 2000, da responsabilidade da seita do Bush filho.
Apesar dessa duplicidade, a frase surpreende pelo nome de quem a subscreve, José Manuel Fernandes, um dos mais veementes porta-vozes na imprensa portuguesa da política fraccionista e sectária (para dizer o mínimo) da administração Bush.
Fernandes escreveu editoriais socorrendo-se de teóricos das várias matizes do intervencionismo bélico americano neo-conservador como Robert Kagan e Robert Kaplan, precisamente os intérpretes e inspiradores dessa política fraccionista e sectária.
Sabendo-se que nunca escreveu uma linha de reflexão honesta sobre o logro que tem sido essa política, o que se terá passado para este desabafo ?

 

Ardeu

O Dakar.
É uma vitória política da Al-Qaeda, a única de que se podem gabar nos últimos anos, tirando o atoleiro iraquiano.
O estupor provocado pela anulação da prova deu lugar às reacções mais inesperadas.
Carlos Sainz comentou que é uma pena que acontecimentos políticos influenciem acontecimentos desportivos, como se os acontecimentos desportivos não fossem, até à medula, factos políticos.
No Público, a cosmopolita Teresa de Sousa escreveu, dando voz à amargura do mais básico adepto de base, que se a prova (ainda hoje, recorde-se conhecida como Paris - Dakar) partisse de Paris, o governo francês não teria sido tão insistente no cancelamento. Qual é o interesse disto? Ela acha que o governo francês anulou de bom grado uma prova que é também um veículo de propaganda? Nem parece a Teresa de Sousa.
O Presidente da Câmara de Portimão, esse, quer inevitavelmente ser "indemnizado".
Largassem-nos, deixassem os gajos partir, que a haver atentados muito provavelmente aconteceriam já passado Portimão e encaixado o investimento. Atentados é coisa dos árabes, Marrocos e por aí abaixo.
A aventura é aventura, e não é raro haver mortes de pilotos ou espectadores.
Porém, se resultasse um morto que fosse, de alguma acção da Al-Qaeda, não faltariam as vozes acusadoras das "falhas de segurança", seria um escândalo cujas proporções o governo francês não quiz, e bem, enfrentar.
Se calhar é tempo de as pessoas reflectirem um pouco.
A imagem romântica do Paris-Dakar, simultaneamente manifestação de empatia paternalista de uma geração pela imagem mitificada de um terceiro mundo inóspito e subdesenvolvido mas exótico, está enterrada.
Garantir a segurança do Dakar nas presentes condições, obrigaria à ocupação militar temporária por forças de confiança, isto é, ocidentais, de uma enorme região, ocupada por vários países.
Sem sequer contabilizar os custos e os problemas logísticos de tal operação, seria politicamente inaceitável .

quarta-feira, janeiro 02, 2008 

O gato e o rato

Afinal parece que o problema da libertação dos reféns é mais complicado do que a grande imprensa deixa transparecer.
As FARC podem ser responsabilizadas por um conceito distorcido de legitimidade revolucionária que os leva a optar pelo rapto de gente inocente, mas, neste momento, é a duplicidade do governo acolitado pelo dedo incansável do amigo americano que torpedeia uma hipótese real de libertação dos reféns.
É mais um exemplo do estilo neoconservador de negociar. Tal como os norte americanos fazem no Médio Oriente, o Governo da Colômbia parece entender que negociar é fazer que se negoceia sem negociar enquanto se reserva aos outros o papel de patetas que vão direitos a qualquer ratoeira que lhes estendam. Funciona sempre bem em séries televisivas, mas na vida real é receita para o desastre.
O que mostra que na Colômbia como noutros locais da América Latina é precipitado tomar partido pelo lado aparentemente mais apresentável para o paladar democrático europeu.

 

Igual a zero

Foi Cavaco quem falou e logo o rebanho desatou a balir preocupações com as excessivas remunerações de certos altos dirigentes.
Então o apego à "liberdade"?
Então a necessidade de "destruir o Estado", romper com qualquer conceito de justiça distribuitiva que tantos danos fará à "dinamização da economia"?
Então os perigos da "igualdade"?
Então a "glória" de ser rico?
Então as vantagens morais de cada um gastar o "seu" dinheiro naquilo que muito bem lhe apetece, por mais disparatado?
"Quero ter a liberdade de comprar o meu Ferrari" dizia o yuppie que deve ter votado no Cavaco, à mesa do restaurante.
A sensação de inexpugnabilidade transmitida por este Governo no fim de um longo processo de anestesiamento político e estupidificação que enquanto foi controlado pelo PSD sempre pareceu de "normalização democrática" é tal, que tudo o que é anti PS se agarra a tudo - literalmente tudo - o que lhes cheire a "ataque ao Governo", nem que sejam os sindicatos, nem que seja o que noutros contextos classificariam de igualitarismo serôdio.

terça-feira, janeiro 01, 2008 

claro e escuro

José Manuel Fernandes tem sido um dos rostos da versão politiqueira básica da troca de gestores da CGD para o BCP. É tudo uma conspiração do PS para dominar o maior banco privado do País.
José Mateus Cavaco e Silva, apresenta no Claro uma análise alternativa: trata-se do rapto pelo maior banco privado, do capital de segredos do banco público através da importação da sua gestão de topo.
A primeira "teoria" parece não ter incorporada mais "visão" do que a básica chicana política de café: ao nível do conglomerado de interesses financeiros que gere o País, o PS e o PSD são cada vez menos a linha de fractura que delimita as fronteiras entre as cliques em competição.
A segunda, mais sofisticada, ignora um aspecto que me parece óbvio: a atitude ética que suporta as vantagens da troca não carece que esta se concretize.
Para um acompanhamento menos convencional do evoluir desta história, será de acompanhar o Claro.

 

Concorrência desleal

A blogosfera é pobre, para os pobres de espírito, é o meu primeiro pensamento assim do tipo espiritual do ano.
Enquanto alguns a "dissecam", o pipal bloga.
Até o Presidente do Irão, Mahmoud Ahmadinejad, se deixou de reticências e começou a blogar, embora com o aspecto negativo (não é por acaso que o outro fala no "eixo do mal") de fazer, em preguiça, concorrência desleal ao Bidão Vil. Colocou 4 posts no último ano!
Tirando a irregularidade, é um blog a sério, que admite comentários e tudo... coisa aparentemente simples mas que não está ao alcance do... (ooops, li bem?) "melhor blog do mundo".
Como seria de esperar a maioria dos comentários são laudatórios, só se espantará com isso quem nunca sentiu a graxa pura que se destilou em todos os quadrantes quando os "famosos" cá da terra surgiram na blogosfera portuguesa. No entanto, lá está bem visível, o comentário de um tal Ken MCfly: "die slow...".

 

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S.Clay Wilson, 1972, Zap Comix n.º 6