Causou alarido a admissão pelo
Tony Blair, durante a entrevista que deu à edição inglesa da
Al-Jazeera, de que a situação no Iraque é um “
desastre”.
Admitiu, não admitiu...pergunto eu:
O que é que isso interessa?
1-Alguém precisava da confirmação?
2-Alguém acha realmente que alguma vez o Blair, ou o Bush ou alguns dos seus patéticos papagaios vai admitir que cometeu um erro trágico?
Sendo assim, penso que a explicação dada posteriormente por Downing Street é correcta. A “
concordância” de Blair resultou apenas duma expressão verbal de cortesia no contexto de uma conversa e não significa aceitação da caracterização da situação feita pelo entrevistador.
No máximo será um lapsus linguae. Ora tentar marcar pontos num debate político deste tipo a partir de um lapsus linguae é colocarmo-nos no plano do adversário político.
O mal, a "guerra preventiva", o caos instalado, está feito, já não interessa especular mais sobre o assunto.
Mais: neste caso, o facto de um político como Blair, responsável directo pelo que se passa admitir o óbvio, de certo modo “enobrecê-lo-ia”, uma hipótese de concretização duvidosa.
O que perturba é que a causa do desastre reside na explicação dada por Blair para o falhanço do "plano".
"It has, but you see what I say to people is why is it difficult in Iraq? It's not difficult because of some accident in planning, it's difficult because there's a deliberate strategy - al Qaeda with Sunni insurgents on one hand, Iranian-backed elements with Shia militias on the other - to create a situation in which the will of the majority for peace is displaced by the will of the minority for war."
Para o Blair e restantes apoiantes da guerra, o que correu mal não foi o tal "plano”, o que correu mal foi o magano do inimigo não se ter conformado com ele ( era tão, tão bom...).
Por incrível que possa parecer, para estes estrategas da guerra do Raul Solnado, a grande surpresa foi o inimigo não ter "colaborado"!
Para os líderes que provocaram a guerra, o inimigo não tem personalidade ou vontade, é plasticina que se “molda” ao sabor da sua vontade.
Isto não é um caso isolado, é a essência da actual linha do "pensamento único".
Pregando aos quatro ventos a contingencialidade de tudo na vida, em particular a segurança na saúde e o posto de trabalho, os nossos líderes "democratas liberais" tomam decisões militares como se todo o adversário que lhes dá na cabeça afrontar fosse um sparring partner, um maduro suficientemente coriáceo pago para levar uns punchs bem afiambrados sem ir logo ao tapete e ripostar quando possível mas com suficiente cuidado para que o campeão não se lesione até ao confronto a sério.
Não é que eu deseje um “confronto a sério”. Não quero estar cá ( nem eu nem ninguém que eu conheça) se um dia houver um confronto “a sério” com a Rússia ou com a China, o que é muito provável que venha a acontecer.
O que eu desejaria é que nunca tivesse vingado a teoria nojenta da preemptive war, por várias razões:
1- por uma questão de princípio. Viola princípios que são a base de uma tentativa séria de prevenir pelo diálogo a eclosão de conflitos militares entre países.
2- por uma questão de pragmatismo. É ineficaz a vários títulos para a nossa protecção contra os avanços do fundamentalismo islâmico e outros.
3- deu no que deu. Já se viu. Os inimigos irredutíveis, fizeram afinal o seu papel e defenderam-se com TODOS os meios ao seu alcance, incluindo o recurso à barbárie mais abjecta.
Quem tinha obrigação de pensar nisto? Quem?
A cada dia que passa mais transparentes parecem os objectivos e as razões que levaram a este desastre. Ignorância, irresponsabilidade, ganância e uma arrogância infinita.